Eleição presidencial nos EUA deve impactar trajetória da economia brasileira
- Macroeconomia e política
- 28/05/2024
- Tendências
Por Rafael Cortez*
A atual conjuntura política no plano internacional está repleta de eventos que, no limite, condicionam a trajetória da economia mundial e brasileira no curto e médio prazo. O eventual retorno de Donald Trump à presidência nos EUA deve trazer uma cena internacional mais turbulenta com efeitos para a economia brasileira.
Grosso modo, há dois canais centrais de transmissão entre o mundo e a economia brasileira: 1) financeiro e 2) comercial. O grau de liquidez nos mercados condiciona o custo financeiro para as economias emergentes. Uma paisagem internacional turbulenta costuma gerar depreciação dos ativos brasileiros, o que em última instância aumenta o custo do crédito para famílias e empresas. O canal comercial é importante vetor de crescimento e aumento de produtividade. Cadeias de produção integradas geram benefícios de controle inflacionário e alocação eficiente de capital, aumentando a produtividade da economia.
A ordem política internacional em mudança pode gerar choques ao longo dos próximos anos por conta da combinação das questões geopolíticas. Há três canais que ligam a possível eleição de Trump nos EUA e o acirramento da ordem internacional, explicando o possível cenário mais adverso para as economias emergentes como a brasileira.
O primeiro deles refere-se ao confronto com a China. O efeito Trump nas relações EUA-China aparece na substituição da estratégia das “políticas de aliança” típicas do governo Biden para uma estratégia de “contenção pela força”. Trump não apenas ameaça uma tributação universal para os produtos chineses, mas prevê um plano de nacionalização da produção de insumos estratégicos para evitar dependência chinesa, inclusive banindo empresas chinesas de serem proprietárias em setores de infraestrutura.
O segundo efeito da eleição de Trump aparece nas relações com a Europa. O grau de coesão do ocidente é a variável que mais deve sofrer impacto em eventual cenário de transição de um governo democrata para um republicano. Biden recuperou a política de alianças estratégicas com a Europa, movimento reforçado com a guerra entre Ucrânia e Rússia, gerando a expansão formal da aliança com a entrada de Finlândia e Suécia.
O terceiro canal desse cenário de aumento das turbulências geopolíticas está associado aos desdobramentos da rivalidade entre EUA e o “eixo da resistência” nos conflitos do Oriente Médio e, por consequência, nos preços de petróleo e fretes marítimos. Trump deverá reforçar a divisão entre o Ocidente e o chamado Sul-Global em relação à política no Oriente Médio.
Esses movimentos, se confirmados, dificultariam a posição da política externa brasileira de se equilibrar entre os pólos e extrair dividendos nos fóruns de decisões internacionais sob a expectativa de dar voz ao Sul-Global, ameaçando o poder de atração do País junto às economias emergentes.
O planejamento estratégico dos próximos anos das companhias brasileiras precisa incorporar os efeitos do mundo em transição. De taxa de juros à política comercial, nada passará incólume às mudanças na ordem internacional. Nesse cenário, a economia brasileira deve considerar os riscos de taxas de juros mais elevadas, crescimento econômico global mais limitado e a possibilidade do acirramento protecionista afetar diretamente as exportações brasileiras de alguns segmentos.
*Rafael Cortez é sócio e cientista político da Tendências, e Doutor e Mestre em Ciência Política pela USP. Responsável pela análise de risco político, é professor do Mestrado em Direito, Justiça e Desenvolvimento do IDP-SP e professor da Escola de Administração de Empresas da FGV (EAESP).
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