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Silvio Campos Neto, sócio da Tendências, explica que dólar deve ficar alto por mais tempo – Globo News

Um levantamento feito pelo Valor Econômico sobre o mercado de trabalho mostra que a parcela dos trabalhadores com rendimento entre 1 e 2 salários mínimos superou os 35% no primeiro trimestre deste ano. O aumento é de mais de dois pontos percentuais na comparação com o mesmo período de 2022.

Os dados mostram que a parcela dos trabalhadores que ganham até um salário mínimo recuou de 36% para 32%, enquanto quem recebe de 1 a 2 salários mínimos subiu de 32% para mais de 35%. Já os que ganham mais de 2 salários mínimos subiu de 30% para 32%.

Então são três dados que confirmam esse mercado de trabalho aquecido e estão relacionadas, também, segundo economistas, a reajustes salariais de categorias acima da inflação, inclusive do salário mínimo nacional, que, hoje, está em R$ 1.412. Cada estado também tem autonomia para estabelecer seus pisos acima disso. Além disso, os dados mostram que existe uma redução dos postos de trabalho de baixa qualidade e uma maior qualificação do trabalhador.

Também há quem diga que essa saída do trabalhador que ganha até um salário mínimo da força de trabalho também está relacionada aos benefícios sociais, mais especificamente Bolsa Família, em um valor elevado.

O levantamento foi feito com base na PNAD Contínua, que é a pesquisa que o IBGE faz todo mês. 

Falando da moeda americana, o dólar segue em escalada, atingindo o maior patamar desde janeiro de 2023. Silvio Campos Neto, economista sênior e sócio da Tendências Consultoria, explicou o porquê da moeda ficar em um patamar mais alto por mais tempo.

“Sempre que há um movimento do dólar chama atenção, é uma variável sempre muito acompanhada por todos. E o que nós temos visto desde o início do ano é esse movimento de alta, (…) que refere-se fundamentalmente a questões externas, mas também a aspectos locais.”

Ele ainda diz que, no exterior, nós temos passado por um período de um dólar mais forte no mundo todo, em virtude da expectativa de que o Banco Central nos Estados Unidos tenha que esperar um pouco mais antes de reduzir as taxas de juros, o que gera uma influência bastante direta no comportamento do dólar.

“Mas, quando comparamos o comportamento do real em relação a outras divisas de emergentes, ele tem tido uma performance bem mais negativa nesses primeiros meses, o que aponta para motivos também aqui no Brasil, desde preocupações com sinalizações de políticas econômicas, temores com a retomada de medidas e políticas já feitas no passado, que não deixaram um legado positivo, as recorrentes preocupações fiscais e uma situação orçamentária muito delicada para os próximos anos.”

Campos Neto ainda diz que, além de tudo isso, ainda existe a transição no Banco Central em meio a muitos ruídos. “Tivemos uma última decisão do Copom com divisão de votos, algo muito controverso, então isso também tem preocupado os agentes, ainda que o cenário econômico atual não seja ruim.”

Quando questionado sobre o quanto desses temor é, de fato, concreto, Campos Neto diz que temos uma situação concreta que justifique uma proteção excessiva, no sentido de que, “primeiro, do ponto de vista fiscal, medidas já foram tomadas já desde o ano passado e que, de certa forma, já condicionam uma trajetória de crescimento de gasto, com muitas incertezas se as receitas irão acompanhar. Ou seja, é difícil, hoje, ver o Brasil conseguindo fechar essas contas. E aí a dívida vai crescendo.”

“Em relação às medidas sinalizadas neste ano, claro que ainda não há nada muito concreto, mas é natural também que os mercados de certa forma incorporem um certo prêmio de risco aos ativos com essas preocupações.”

Campos Neto aponta que, sobre a situação do Banco Central, é a mesma coisa. Há um temor de que, eventualmente, no ano que vem, o BC possa seguir uma linha um pouco mais voluntarista de redução de juros.

“Particularmente, não acredito nisso. Creio que o BC seguirá numa atuada técnica, mas é normal que com essa dúvida isso faça preço nos ativos. Naturalmente, não só a curva de juros futuros sobe, mas o próprio dólar também acaba subindo. 

Sobre a correlação entre a política fiscal, os gastos do governo e o dólar, Campos Neto diz que, na verdade, é uma questão de percepção de risco. Quando temos um cenário fiscal que é visto como não sustentável, com a dívida crescente nos próximos anos, isso faz com que exista o temor de que, em algum momento, não seja possível honrar com esses compromissos ou que, de certa forma, isso exija algumas políticas corretivas que são difíceis, inclusive politicamente. Pela própria percepção de maior risco, isso faz com que a nossa moeda se desvalorize.

“Existe uma relação muito conhecida para avaliar movimentos do câmbio, que é chamada paridade descoberta de juros, que leva em conta o diferencial de juros entre o resto do mundo, Estados Unidos majoritariamente, e o Brasil, ponderado pelo prêmio de risco. Ou seja, quanto maior a percepção de que temos um risco interno, maior seria, por exemplo, a taxa de juros necessária para compensar esse risco e manter a nossa taxa de câmbio mais estabilizada. Fundamentalmente, o canal é esse: a percepção de um maior risco fiscal gerando uma precificação diferente nos ativos, no caso, uma desvalorização cambial maior.

Claro que o mercado que administra dinheiro de terceiros, aplicações, investimentos, poupanças, faz uma análise de risco político bastante rigorosa. Porém, do ponto de vista político, o governo também enxerga o mercado financeiro como um fator de desestabilização, um fator de desconfiança constante e que cobra preços muito altos para Quando questionado sobre como é que se concilia o governo e o mercado, uma vez que parece não ter uma ponte entre esses dois mundos, Campos Neto diz que o mercado cumpre o papel dele, que é o de precificar esses riscos e essas dificuldades.

“Quando há uma sinalização de que você tem um caminho mais sustentável pela frente, isso melhora a percepção de risco. Posso dar vários exemplos. (…) Além do dólar, um ativo onde aparece muito claramente isso são as taxas de juros futuras de mercado, que é o quanto o mercado espera que os juros estarão ao longo dos próximos 2, 3, 10 anos. 

Campos Neto aponta que, muitas vezes, as críticas são focadas demais no Banco Central, como os juros estarem muito altos por conta da alta da Selic está muito alta.

“Na verdade, não é bem assim. A Selic é uma taxa de referência de curto prazo, mas o que importa para o custo do capital, para o crédito em particular, é o custo do capital mais a médio e longo prazo e isso envolve fundamentos. (…) Isso piora a situação fiscal, tem riscos de um maior intervencionismo econômico. Tudo isso faz com que os juros de mercado subam, porque se espera que, lá na frente, até para corrigir eventuais problemas, inflacionários inclusive, os juros também terão que ser mais elevados.”

“O mercado está cumprindo o seu papel. Se a gente lembrar num passado, depois da adoção do teto de gastos e de outras medidas que visavam corrigir a questão fiscal, como a TLP e a reforma da previdência, os juros de mercado caíram substancialmente. E isso deu confiança para que o Banco Central, à época, reduzisse também a Selic. Podemos lembrar que a Selic, em 2019, alcançou 4,5% antes mesmo da pandemia. Mas por quê? Porque ao longo de vários anos se fez uma agenda econômica que indicava um caminho sustentável à frente. Agora, o que você tem é o inverso. É uma preocupação, quando se olha dois, três, cinco anos à frente, que eventualmente a nossa dívida siga numa tendência de alta e que não exista sustentabilidade fiscal. Fatalmente ,isso vai para o preço.”, aponta Campos Neto.

Quando questionado sobre o que Campos Neto está projetando em relação a juros nos Estados Unidos, ele diz que “havia, no final do ano passado, uma perspectiva mais otimista de que os juros dos Estados Unidos poderiam cair ao longo deste primeiro semestre, mas isso não se concretizou, porque a inflação nos Estados Unidos também segue muito pressionada. Vinha numa tendência de queda e estabilizou em níveis muito acima ainda das metas do Federal Reserve.”

“Pensando para este segundo semestre, a expectativa é que, ainda assim, esse espaço de queda de juros ocorra, porém mais para o final do ano. Por essa razão que o dólar andou um pouco mais pressionado. Já vemos sinais de desaceleração da economia americana, com o próprio mercado de trabalho também nessa direção, (…) mas o FED não reduzirá juros enquanto a inflação por lá não apontar mais na direção das metas. Então esperamos que isso ocorra mais para o último trimestre, parte do mercado aposta em setembro, mas o fato é, esse processo de queda de juros nos Estados Unidos tende a ser gradual, tende a ser muito lento.”

Ele finaliza dizendo que “temos que nos acostumar, ao longo dos próximos anos, com juros no exterior, mesmo que em queda, mais altos do que o padrão que vínhamos observando antes da pandemia. E esse é um fator, sim, de risco não só para o Brasil, mas também para outros emergentes, um mundo de juros mais altos.”

É difícil saber até ponderar quanto que é o risco político brasileiro e econômico e quanto que é o risco internacional e eu me lembro da entrevista de ontem do Kenneth Rogoff que esteve aqui, esse economista do SMI, deu uma entrevista aí, fez uma palestra aqui em São Paulo e ele disse que esse é o mundo novo, não adianta querer fugir dele. Haverá inflação resistente e, portanto, juros altos.

“É um mundo mais desafiador para todos os emergentes, para nós inclusive, que também temos as nossas fragilidades. Isso, de certa forma, impõe a necessidade de uma linha muito mais responsável e muito mais sustentável, porque caso contrário, qualquer emergente que sair mais dessa linha, será muito mais penalizado nesse ambiente.”.

Confira a entrevista completa no vídeo abaixo!