EUA: reservas de poupança e estoque de investimento explicam avanço de 4,9% no PIB – Exame
- Na Mídia
- 27/10/2023
- Tendências
Apesar do aperto monetário do banco central americano, desaceleração da economia ainda não se materializou — mas há sinais de que isso possa acontecer em breve
O apetite dos consumidores nos Estados Unidos continua a sustentar o crescimento do país, que aumentou ao ritmo anualizado de 4,9% no terceiro trimestre de 2023. Na prática, as reservas de poupança acumuladas durante a pandemia, quando os norte-americanos deixaram de comprar, continuam sendo gastas ao longo de 2023. E levam ao questionamento de se a recessão esperada por agentes do mercado virá ou não.
“O crescimento dos Estados Unidos surpreendeu, sem dúvidas. Já se esperava um número forte, mas veio ainda mais forte”, diz o economista Silvio Campos Neto, da Tendências Consultoria.
Segundo ele, o consumo das famílias e o estoque de investimentos responderam por essa surpresa. “A demanda segue aquecida, ainda que seja esperado que a economia sinta o forte aperto monetário que foi feito pelo FED (Federal Reserve, o Banco Central dos Unidos)”, afirma, referindo-se ao aumento das taxas de juros de 0,25% ao ano para 5,50% desde o início de 2022.
Na avaliação de Campos Neto, mesmo com os erros de projeção do mercado — que tem sinalizado uma queda do nível de atividade que não tem se confirmado em números —, os dados começam a mostrar uma possível desaceleração do nível de atividade nos próximos meses.
“O FED veio em processo intenso de alta de juros. A política monetária tem suas defasagens. O que pode estar acontecendo é uma demora maior. A questão da poupança retarda o impacto da política monetária. Mas um exemplo que mostra o início dessa desaceleração é impacto no mercado imobiliário. As taxas longas de 30 anos das hipotecas estão nos maiores níveis. O dado semanal dos contratos de hipotecas fechados está nos menores níveis. Juro para cima significa negociações para baixo. Significa que estão acontecendo menos negociações de novas hipotecas. Isso aponta para que o aperto monetário está causando efeitos. Não apareceu no PIB, mas a tendência é que apareça”, afirma.
Como as reservas de poupança vem sendo consumida, a situação sugere que o atual fôlego econômico não será mantido. “Com poupança menor e juros mais altos, a tendência é de moderação do nível econômico com essa poupança remanescente sendo consumida”, diz Campos Neto.
O economista da consultoria Tendência adiciona ao cenário global a queda da inflação. “Estamos em um processo desinflacionário global. Índices chegaram a 3,7% nos EUA e 4,3% na Zona do Euro em dados de setembro”, afirma.
É possível olhar para esse fenômeno de duas formas distintas, observa: em um cenário de copo meio cheio, os índices de inflação estão abaixo dos picos, quando chegaram a 10%.
Em um olhar de copo meio vazio, a subida dos preços segue com variação elevada e acima dos objetivos e histórico dos bancos centrais.
E o crescimento global?
Para o economista Mohamed El-Erian, presidente do Queen’s College em Cambridge e conselheiro econômico-chefe da Allianz, os grandes motores da economia global estão hoje em uma situação difícil. Em especial, a Europa se aproxima de uma recessão e a China desacelera. Nesse contexto, a economia dos EUA emergiu como o principal gerador do crescimento, escreveu em artigo no Project Syndicate.
Ele chama a atenção para as rápidas mudanças nas previsões para a maior economia do mundo. Quando a narrativa da economia americana, que conta com instituições sólidas e uma base produtiva diversificada, muda com tanta velocidade, não surpreende que a incerteza no restante do mundo aumente.
El-Erian aponta tendências gerais para a economia global e possíveis cenários futuros. No primeiro deles, uma tendência otimista, o economista avalia que os avanços em inteligência artificial, ciências e energia limpa podem ampliar a produtividade ao redor do globo e impulsionar o crescimento potencial do PIB.
Por outro lado, alerta que o recente aumento nas taxas de empréstimos globais dure por mais tempo do que o previsto, uma vez que bancos centrais nos EUA e outras grandes economias elevam taxas de juro para combater tendências inflacionárias — diagnosticadas erroneamente, na avaliação de El-Erian.
Esse cenário aumenta o risco de recessões e turbulências nos mercados financeiros. “Vimos sinais precoces disso em março, quando o descontrole do balanço e falhas na supervisão bancária levaram à falência de alguns bancos regionais dos Estados Unidos”, escreve o economista.
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