2025: muito trabalho + cautela – Revista Distribuição
- Na Mídia
- 16/10/2024
- Tendências
Apesar da previsão de crescimento da atividade econômica e outras variáveis positivas, especialistas recomendam atenção no próximo ano
O atual panorama econômico aponta indicadores positivos que puxam para cima o consumo, mas que exige cautela das empresas. O PIB (Produto Interno Bruto) surpreende com crescimento além do esperado, estimado em 3,2% para este ano, e a taxa de desemprego recua para 6.9% (apurada no segundo trimestre), a menor registrada nos últimos dez anos, apontam o lado positivo. Mas o ponto que merece atenção é a inflação, próxima do topo da meta oficial (4,5%), o que faz com que a taxa Selic mude a trajetória, rompendo o ciclo de estabilidade e de queda, e retome as expectativas de alta. Alessandra Ribeiro, sócia e diretora de macroeconomia e análise setorial da Tendências Consultoria, mantém a projeção de alta do PIB de 2,9% (2024) e de 1,7% (2025). Segundo informou, o cenário está melhor do que era esperado no início do ano, com as estimativas sendo revisadas positivamente e frequentemente.
“Percebemos uma força da atividade econômica muito amparada em consumo das famílias e em investimentos, dois drivers importantes que geram emprego, renda, compra de bens e de serviço, além da demanda por créditos”. (Alessandra Ribeiro, sócia e diretora da Tendências Consultoria).
Entre os impulsos que proporcionam até então um melhor ambiente econômico estão os aumentos de gastos públicos; do salário mínimo, atualmente de 1.412 reais (reajustado pela inflação e com ganho real); e a queda de juros antes observada. Também contou a favor a resiliência da economia internacional, pelo menos até a primeira parte deste ano, em especial da economia americana.
Comércio em alta
Para a economista, 2024 deve encerrar com indicadores positivos, que podem fazer o comércio amplo crescer 5% e em 4,4% para supermercados e outros canais semelhantes. A alta projetada para artigos farmacêuticos surpreende por alcançar o patamar de 14,5%, contabilizando artigos de perfumaria e de higiene pessoal, cestas que ganham força quando aliviam o bolso do brasileiro. Colaboram para isso a taxa de desemprego, que deve encerrar o ano em baixa, na média de 6,9%, ante os 7,8% apurados anteriormente, enquanto a massa de renda das famílias deve subir 7%, um ponto acima do registrado no ano passado.
Quando se considera um possível cenário para 2025, Alessandra Ribeiro acredita que haverá crescimento, porém em patamares mais baixos, em ritmo mais brando.
“Acreditamos em novo ciclo de alta de juros, que deve chegar a 12% no início do ano que vem, e no menor aumento dos gastos públicos, considerando a regra fiscal e a economia internacional, com China e EUA afrouxando o corte de gastos. São variáveis que refletem no emprego e na renda, e alcançam o comércio amplo e o desemprego dos supermercados, que vão crescer em ritmo menor, em 2,3% e 1,7%, respectivamente”.
Dois lados da moeda
Felipe Tavares, economista-chefe da CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo), reforça que a economia brasileira surpreende e emite sinais que possibilitam traçar cenários diferentes e até confusos para o planejamento das empresas. Pelo viés otimista, tem a renda e o consumo em alta, mercado de trabalho aquecido, fatores positivos para o varejo e empresas abastecedoras. Já pelo lado pessimista, estão a dívida pública elevada, os gastos públicos sem controle e perspectiva de aumento de inflação de juros. “O ponto de equilíbrio seria a observação das duas visões e considerar que se tivermos os fatores estruturais controlados, as variáveis otimistas parecerão, porque vão gerar renda”.
Esse olhar é importante, acrescenta, pelo fato de 2025 sinalizar maior desafio para o varejo. “Estamos vivendo um crescimento econômico muito baseado no consumo, impulsionado após um período de alto desemprego e redução da renda ocorrido nos últimos anos. Mas existem fatores preocupantes, como o aumento dos gastos e endividamento público, crédito mais restrito, em razão da alta de juros, além do risco de maior inadimplência, que já não está em patamar favorável. Temos de olhar com mais cuidado a projeção futura, no que é mais resiliente em momentos de turbulência e garantir um planejamento mais tranquilo.”
A projeção da CNC indica crescimento do consumo e do comércio (em 2,1%) neste ano. Entre os cuidados que as empresas precisam tomar, o economista recomenda manter a atenção no gerenciamento de estoque, reduzir e evitar exposição ao risco. Outra sugestão é ter o caixa na conta justa para evitar a dose amarga em momento de queda de vendas. “Caixa espremida e estoque alto podem levar o varejo à crise em dois ou três meses. O canal indireto, por sua vez, sente a pressão de fornecedores, e têm clientes com risco de crédito e logística difícil. Se ele consegue ter um giro de estoque inferior a 30 dias, terá uma caixa mais protegida. Recomendo ainda negociar o portfólio com o fabricante.”
Pequenas compras
Domenico Filho, diretor de varejo da NielsenIQ no Brasil, observa que a perspectiva positiva para o desemprego deve ser considerada juntamente com o fato de que, na outra ponta, o emprego informal atinge 40% da força de trabalho. “Isso traz menor patamar de salário e uma rotina de entrada de dinheiro para as famílias ao longo de cada mês, semanalmente ou diariamente. E aponta para uma situação diferente de consumo, de compras picadas, menores, realizadas mais vezes. O impacto dessa mudança, de certa forma, favorece o pequeno varejo, embora não descarte o varejista grande e o atacarejo, que estão cada vez mais próximos (geograficamente) do consumidor.”
A inflação (quase no topo da meta oficial) é outra variável de impacto do consumo, pressionando o bolso de famílias endividadas – situação que alcançou, em agosto, 78% dos respondentes da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor, da CNC. Além desse sinal de alerta, ainda eleva a taxa de juros, avalia Domenico Filho.
Pelas contas da NielsenIQ, o varejo apresentou no primeiro semestre crescimento de 6% em volume e de 8,6% em faturamento, na comparação com igual período de 2023. Para o encerramento deste ano, aposta em crescimento próximo ao atual.
O consultor Alberto Serrentino, fundador da Varese Retail, por sua vez, enxerga um movimento fortalecido de consumo no canal alimentar. “O sinal de alerta está no aumento dos juros, que impactará mais as vendas de bens duráveis, de materiais de construção e a aquisição de outros produtos que dependem de crédito”, assegura.
Na avaliação do especialista, as empresas precisam considerar o curtíssimo prazo e também a agenda estruturante. “Devem ter o equilíbrio entre dois movimentos, pensarem em ajustes para o futuro próximo, com planejamento de demanda, estoque e compras, e na precificação. E terem ainda o controle da agenda de longo prazo, como a digitalização, o uso da inteligência artificial e a automação de processos-chave para ganhar eficiência e produtividade.”
Empresas do setor mantêm os pés no chão
Embora os indicadores sejam importantes para mostrar caminhos da economia brasileira, as empresas do canal indireto sabem que o setor tem suas peculiaridades, bem como as regiões de atuação. A Oniz Distribuidora enfrenta, simultaneamente, o desafio de manter os pés no não considerando a conjuntura nacional e, principalmente, os problemas surgidos com a inundação do Rio Grande do Sul, estado responsável por 40% do faturamento da empresa. “Na região, a economia ainda está retomando. Os clientes varejistas atingidos pela enchente ainda enfrentam bastante dificuldade, especialmente os pequenos. Alguns nem conseguiram abrir as portas até agora e temos três ou quatro clientes grandes fortemente impactados”, observa José Luís Turmina, CEO da distribuidora.
A empresa colocou em prática um programa de ajuda aos pontos de vendas atingidos, com ações, como alongamento de prazo de pagamento e ofertas de mercadorias bonificadas (concretizadas com o auxílio de fornecedores). Além do mercado gaúcho, a Oniz abastece o Paraná e o interior de São Paulo, sendo que este último vem sendo o alavancador de negócios para a companhia, que prevê crescimento acima de 10% para 2024.
A empresa tem um portfólio de 2 mil itens e 30 mil clientes. E mantém no radar o cenário nacional e o poder de compra do brasileiro. “Creio que a sensação de instabilidade e a insegurança com o futuro pesam na decisão do consumidor. Ele está muito mais consciente e cuidadoso, busca o melhor valor para o dinheiro (custo x benefício), o que, em algumas categorias, estimula o trade down (movimento de escolha de produtos de menor valor) e, em outras, o trade up (indicador de compra de itens de maior valor).”
O empresário destaca ainda a importância de considerar a “disputa” de diversos setores pelo orçamento limitado do brasileiro, que vai dos gastos com a casa até o lazer, e inclui compras no varejo, apostas online e serviços de internet. “Tem ainda o endividamento caro para compra de bens duráveis.”
Turmina entende que as empresas têm de atuar com foco mais apurado na execução, na busca pela eficiência da gerência de custos e na criação de valor. “Creio que serão os pontos-chave para as empresas perdurarem e crescerem nos próximos anos, quando tanto o cenário internacional quanto o regional parecem propícios para as empresas nacionais”.
De norte a sul
Com uma operação gigante, de abrangência nacional, o Grupo Martins administra uma carteira de 120 mil clientes atendidos mensalmente, sendo 74 mil do canal alimentar, que, juntamente com a farma, alcança 90 mil, e dos ramos de material de construção e eletros. Com um mix de 24 mil produtos, a empresa mantém a rotina de focar na gestão sob o olhar atento nos movimentos observados a curto prazo, sem perder de vista os planos de investimento e perspectiva a longo prazo, como recomendam os especialistas. “Temos uma preocupação grande em acompanhar a gestão de estoque, mesmo porque o grande investimento é feito no capital de giro. E também olhamos os prazos concedidos de pagamento, índice de inadimplência. E não só pela perspectiva de cortar crédito, como também para ampliar a oferta”, explica Rubens Batista Junior, CEO da empresa. Embora observe que atividade econômica esteja em um momento favorável, Batista enxerga a importância de avaliar o ritmo dos negócios a partir das respostas obtidas no mercado e agir com cautela. “Precisamos olhar para o nosso setor, principalmente para o pequeno e médio varejista que vende produtos de grande necessidade, cesta que é sinalizadora de como está a demanda de fato, ainda não vemos esse impacto tão favorável do PIB. Notamos, sim, o movimento de trade down.”
No ano passado, o executivo recorda que ocorreu forte queda de preços e, agora, é possível detectar a busca pela recuperação de preços e, agora, é possível detectar a busca pela recuperação de preços, o que causa um componente “de certa forma” inflacionário. “É importante considerar que existe um ambiente extremamente competitivo, de conflito de canais de vendas. Vemos também os clientes buscando produtos mais baratos mudando marcas. Ou seja, neste momento não se observam essas notícias tão boas com a possibilidade de forte aumento de demanda”, reforça.
O grupo mantém a previsão de encerrar 2024 com crescimento de um dígito no varejo alimentar e farma. “Percebemos que cada vez mais os negócios levam em consideração o momento do consumidor. E, por isso, aumentam o número de lojas e de categorias que trabalham. Hoje, vemos farmácias que são quase uma loja de conveniência.”
Duplo papel
A Casa Flora Importadora, que trabalha como atacadista e distribuidora de produtos por todo Brasil, começou a importação direta nos anos 1990, expandindo além do papel de atacadista. Segundo Antonio Carvalhal Neto, um dos seus fundadores e descendente de um dos fundadores, a expectativa está bem grande para este fim de ano e também para 2025. “Temos um duplo papel na cadeia de abastecimento, de importar e distribuir para as empresas do setor, além de abastecer os milhares de restaurantes, bares, hotéis, varejistas, enfim estamos sempre observando o cenário econômico porque para importar se demora cerca de 90 dias, desde comprar até chegar para nós, em nossos CDs, que são dois, um em Guarulhos/SP e outro próximo a Curitiba, no Paraná”, explica Neto.
Ele acrescenta que o consumidor está se permitindo a conhecer e experimentar novos produtos. “Aconteceu durante a pandemia e continua até hoje, o brasileiro quer desfrutar de novidades (alimentos e bebidas) daí o nosso desafio, mas sempre de olho no cenário econômico que continua muito desafiador”, observa.
A exploração de produtos como frutas secas, azeitonas e bacalhau iniciou na década de 1990, mas são as viagens para prospectar fornecedores e participar de feiras internacionais que abriram os olhos para um mercado ainda escasso no Brasil: o vinho. Em poucos anos, a Casa Flora consolidou e deu estrutura à importação de vinhos, estabelecendo, em 1998, a importante parceria com a Vinícola Santa Carolina. Mais recentemente, Neto esteve no Japão para conhecer o que poderia ser vendido no Brasil. “Isso não quer dizer que não trabalhamos com indústrias brasileiras e também com a nossa marca própria”, lembra.
Para entrar bem o ano de 2025, o empresário destaca que já foram feitos e introduzidos novos processos na empresa, adequando a gestão e com investimentos em tecnologia, além de comemorar os 35 de trabalho no quesito importação para atendermos com excelência os nossos clientes do canal indireto com produtos, inovadores e prestar um bom serviço.”
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