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Por que o Poder Público está interessado em concessões?

Imagine um município do interior que não possua um hospital próprio. Cada vez que um habitante fica doente, ele deve se deslocar para uma cidade próxima e, em casos de emergência, ser atendido por uma ambulância mantida pela prefeitura, que se deslocará para outra região. Essa é a realidade de muitos lugares no Brasil.

Obviamente, a população deseja ter um hospital mais próximo, para ser atendida o mais rápido possível. O Poder Público também compartilha deste desejo, até porque os gastos com ambulâncias e soluções paliativas oneram o orçamento. O problema esbarra fundamentalmente na escassez de recursos públicos – investimentos em infraestrutura, como no caso dos hospitais, demandam dinheiro que nem sempre está disponível.

Concessões como solução para realizar investimentos

Uma solução para estes casos é efetuar investimentos com o apoio de um ente privado, por meio de uma concessão, por exemplo. Nos anos 1990, o Brasil começou a desenhar um modelo alternativo ao que era usado quando falamos em infraestrutura. Até então, o Estado conduzia o setor, realizando grandes investimentos. Contudo, devido aos desequilíbrios macroeconômicos e à busca pela estabilização, o governo restringiu sua atuação visando equilibrar as contas públicas. Nesse contexto, por meio da Lei nº 8.987 (Lei de Concessões) e da privatização dos segmentos de energia e telecomunicações, a iniciativa privada passou a ter uma crescente relevância no que tange ao desenvolvimento da infraestrutura.

As concessões, que consistem em um acordo em que o Poder Público permite que empresas privadas usem, explorem ou administrem bens públicos, começaram as ser implementadas no Brasil como uma alternativa para resolver a questão da falta de recursos do Estado para investir em infraestrutura e serviços públicos. Assim, as concessionárias passam a assumir responsabilidades de construção, manutenção e operação dos bens, que podem ser grandes infraestruturas (portos, aeroportos e rodovias, por exemplo) ou até mesmo operações relativamente menores (hospitais municipais ou áreas de lazer, por exemplo).

Atratividade para o setor privado

Claro que, em troca dos investimentos, o ente privado espera ser remunerado, e por isso o desenho dos contratos de concessão deve contemplar um modelo de geração de receitas, bem como alocação de riscos entre ele e o poder público. Em alguns casos, a concessão consegue ser atrativa por si só, gerando receitas através de tarifas pagas pelos usuários (pedágios em rodovias, entre outras) ou por meio de exploração de receitas acessórias. No caso de mobiliário urbano (paradas de ônibus, relógios etc.), por exemplo, é comum que as empresas gerem receitas explorando publicidade nos locais onde os equipamentos são alocados.

Para os casos em que a concessão, por si só, não é atrativa, restam outros mecanismos que podem aumentar a viabilidade do projeto. Nas Parcerias Público-Privadas (PPPs), por exemplo, além da receita tarifária, o Poder Público também pode fornecer recursos, dinheiro propriamente dito ou terrenos, por exemplo.

Vantagens para a sociedade

As concessões são uma alternativa para melhorar a qualidade dos serviços oferecidos à população e para atrair investimentos privados. Ao mesmo tempo, o Estado mantém seu papel regulador, fiscalizando a atuação da empresa privada para garantir que as obrigações contratuais sejam cumpridas e que o interesse público seja atendido.

Tal modelo favorece um incentivo à eficiência que não poderia ser alcançado pelo Poder Público. Notadamente, os licitantes possuem expertise na área em que irão atuar e, por mais que o governo possa ter excelentes gestores, a estrutura pública se vê restringida por um contingente de pessoal, cujos servidores costumam acumular diversas funções, além das amarras burocráticas que muitas vezes impedem que o tomador de decisão responda de forma rápida frente a determinadas situações.

Aspecto político

Sob o ponto de vista político, as concessões mostram-se como uma solução mais confortável para que o governo possa defender um aumento da participação do setor privado sem avançar para a solução de privatização propriamente dita, já que o Estado mantém a titularidade do bem público concedido.

Haja vista os fatores apresentados, as últimas décadas mostram o Poder Público recorrendo de forma crescente às concessões. Conforme o levantamento “Avaliando os Estados em PPPs e Concessões (19-22)” publicado em janeiro pela Radar PPP, o total de iniciativas lançadas pelos Estados subiu de 248, entre 2015 e 2018, para 357, no ciclo de 2019 a 2022. No caso dos Municípios, as iniciativas estão indo muito além de concessões relacionadas com Saneamento Básico e Iluminação Pública – São Paulo, por exemplo, possui em seu portfólio de concessões de mobiliário urbano, cemitérios, parques, mercados, entre outras.

Como fatores de atenção, há que deixar registrado que os contratos de concessões costumam ser de longo prazo e, portanto, é necessário que o processo seja desenhado de modo a evitar que o licitante vencedor seja incapaz de realizar a operação. Também deve-se desenvolver uma matriz de riscos e um sistema de remuneração que se mostrem atraentes para um investidor privado, porém que não onerem em demasia os usuários.

Considerando as diversas vantagens deste tipo de contrato, é natural que o número de iniciativas deste tipo esteja aumentando. Talvez o principal entrave atualmente ainda resida na capacidade de estruturação e elaboração de projetos que sejam atrativos tanto ao Poder Público, visando o bem-estar da população, como aos investidores privados, que irão explorar a concessão.

Por: Fábio Tieppo, Maurício Palugan e Samuel Ribeiro.

Fábio Tieppo é analista da Tendências Consultoria, onde atua em projetos de defesa da concorrência, reequilíbrio econômico-financeiro de contratos e como assistente técnico em perícias envolvendo concessões. É mestre em Economia pela FEA/USP. Graduado em Engenharia de Produção pela Escola Politécnica da USP e em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, com pós-graduação em Administração de Empresas pela FGV-SP.

Maurício Palugan é analista da Tendências Consultoria, onde atua em projetos de temáticas diversas envolvendo concessões, contenciosos arbitrais e judiciais e reequilíbrio econômico-financeiro de contratos em diferentes setores. Graduado em Ciências Econômicas com trilha em Economia Política pela FGV-SP.

Samuel Ribeiro contribui para a elaboração de estudos econômicos com temáticas diversas na Tendências Consultoria. É graduando em Ciências Econômicas na FECAP.

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