Tendências no podcast CEPP Talks – Parte 1
- Na Mídia
- 02/10/2025
- Tendências
No 13° episódio do podcast CEPP Talks – Papo com Especialista, os consultores da Tendências Fábio Tieppo e Mário Westrup falam sobre a Reforma Tributária e seus efeitos no cotidiano e em projetos de estruturação de parcerias público-privadas (PPPs) e concessões
Maílson da Nóbrega, sócio-fundador da Tendências Consultoria e ex-ministro da Fazenda, fala que a Reforma Tributária é um meteoro vindo para a Terra e precisamos nos preparar. A pergunta levantada é: que meteoro é esse? Que Reformaé essa? O que devemos esperar?
Westrup explica que, na Tendências, são usados alguns termos, como meteoro, mas o que mais gostam é do termo “revolução”, quando se trata da Reforma Tributária. É tudo ao mesmo tempo, a toda hora, uma mudança realmente relevante.
A Reformacomeça de forma simples na teoria: substituição de tributos. Primeiro substituir tributos indiretos sobre o consumo, que são tributos hoje dos estados e municípios, transformando no IBS, imposto sobre serviço. E transformar PIS/COFINS e IPI na CBS, contribuição sobre bens e serviços.
O IPI não está sendo extinto 100%, continuará existindo por proteção à Zona Franca de Manaus. Produtos elencados nos processos produtivos básicos da Zona Franca terão incidência zero, para equilibrar o jogo. A Zona Franca de Manaus foi mantida na Reforma.
Além dessas substituições, há mudanças profundas. Duas principais: fim dos incentivos fiscais em relação ao ICMS e cobrança no destino. Esses são dois impactos gigantescos.
Westrup explica que, atualmente, muitos estados se desenvolveram com políticas públicas de concessão de créditos presumidos de ICMS ou de redução de base de cálculo. Isso não vai ser mais possível. Esses benefícios acabam justamente para que se crie um IVA em nível nacional com alíquota única, exceto nos setores que terão algum redutor.
Esse fim dos incentivos mexe na estrutura de alocação dos últimos 40 anos, quando os empresários se organizaram em torno desse sistema, aproveitando o que chamamos de turismo tributário.
Faz sentido, por exemplo, ganhar um incentivo tributário em Santa Catarina, mandar o produto para a Zona Franca de Manaus, depois passar por São Paulo e voltar para o Paraná. Em vez de ter produção e logística eficientes, se fazia todo um turismo tributário para capturar esses incentivos e chegar com um ganho competitivo ao cliente. Isso não faz sentido, mas foi a lógica dos últimos 40 anos desde 1988, com a Lei Kandir.
Além disso, com a cobrança no destino, o tributo não está mais na origem. A arrecadação passa a ser feita no destino, o que muda a lógica dos incentivos tributários. O empresário passa a querer estar mais próximo do cliente.
Esses dois pontos — fim de incentivos fiscais e cobrança no destino — representam uma verdadeira revolução da Reforma Tributária.
Também muda a forma de contabilizar os tributos. Hoje, no Brasil, a receita bruta aparece no DRE com deduções, mas no mercado financeiro a referência é a receita líquida, seguindo o modelo americano. O tributo não é da empresa, e sim do governo. Com tantas distorções, incentivos e regimes específicos, era necessário considerar o tributo para entender as vantagens econômicas.
O empresário vai passar a olhar para a receita líquida, porque a receita bruta inclui os tributos. Agora os tributos são todos “por fora”, sem cálculo de ICMS por dentro ou incidência sobre outros tributos.
Quanto aos créditos, a Reformaprevê a não cumulatividade ampla. Westrup explica que toda despesa consumida tende a gerar crédito tributário. No sistema do IVA, cada etapa agrega valor e o tributo incide apenas sobre o valor agregado. Se a etapa anterior já pagou tributo, ele vira crédito e você paga apenas sobre o valor que acrescentou. Isso muda o paradigma do sistema tributário brasileiro, que atualmente possui muitas despesas cumulativas, mesmo para empresas no lucro real.
Impacto da Reforma Tributária
Para entender o impacto da reforma, a primeira pergunta deve ser: qual é a carga atual e qual será a carga nova? E Westrup diz que tem visto alguns equívocos ao longo dos trabalhos feitos.
Ele explica que, para fazer uma comparação isonômica do sistema atual com o sistema novo, é preciso comparar o quanto se paga de tributo, tanto nas receitas quanto nos custos e despesas. Aí sim teria o valor da carga tributária real, podendo ser levada para uma comparação com o novo sistema. Nesse novo sistema de não cumulatividade ampla, é possível calcular de fato qual é o impacto da Reforma.
São mudanças profundas, estruturantes, que vão afetar tanto a parte de logística quanto a renegociação de contratos e preços, além de estratégias e até mesmo fusões e aquisições. As cadeias podem se reorganizar, então tem um impacto importante.
Há ainda um último impacto: o split payment. Ou seja, há a possibilidade de o tributo nem circular pelo seu caixa e já ser recolhido automaticamente. É um conjunto de novas regras que, no geral, são positivas, mas que precisam ser analisadas com muito cuidado.
Transição da Reforma Tributária
A simplificação da Reforma Tributária, de fato, acaba com uma série de contenciosos. Westrup acredita que isso é um ponto muito importante. No entanto, ele menciona que temos a transição pela frente.
E estamos falando de uma transição longa, árdua, de adaptação, em que, infelizmente, o legislador pode começar no meio do caminho a criar algumas questões.
Westrup traz um ponto: ele acredita que a Reformaé extremamente positiva, mas aponta que, há duas semanas, começamos a ter uma discussão, que era sobre se o IBS e o CBS irão compor a base de cálculo do ICMS e do ISS na transição.
Ao mesmo tempo em que Westrup quer acreditar muito nessa simplificação e nessa transparência, na questão dos créditos, que realmente vai funcionar, teremos algumas discussões e brechas que, infelizmente, serão aproveitadas para o bem e para o mal. Ou seja, o agente econômico racional vai utilizar aquilo que é possível para alocar recursos.
De acordo com Westrup, existem alguns detalhes que precisam ser tratados com muito cuidado e bastante planejamento durante a transição, por conta dos empresários.
Tieppo explica que o período de transição será bastante complexo, mas a ideia é que, com a Reforma Tributária e a substituição gradual no longo prazo, haja menos contencioso e a tributação se torne mais clara para o consumidor, permitindo que ele enxergue exatamente o que está pagando de tributo.
Além disso, espera-se que, por ser mais simples tanto para o contribuinte quanto para o governo, ocorram menos fraudes, menos discussões e menos conflitos entre diferentes entes federativos.
Setores afetados
Tieppo diz que é esperado que cadeias mais curtas, principalmente serviços, tenham uma carga tributária maior, mas cada caso é um caso, tanto em nível de empresas quanto em projetos de infraestrutura e concessões. Cada projeto é diferente.
Tudo isso faz com que as empresas sejam afetadas de formas diferentes. E por que isso vai alterar os preços relativos? A carga tributária vai mudar: algumas empresas serão beneficiadas, outras terão uma carga maior, e outras podem permanecer relativamente neutras. Isso porque a Reforma Tributária prevê que a alíquota de referência será aplicada a todos, mas existem redutores e regras específicas que acabam modulando o efeito.
Então, de acordo com Tieppo, a ideia de super simplificação já no cenário brasileiro, ela já foi um pouco um pouco diluída. E ele reforça que, durante o período de transição, isso será bem complexo.
Westrup diz que estamos falando de uma possível mudança nos setores a médio e longo prazo em fusões, aquisições e reorganizações societárias para fazer sentido tributariamente. Ele também diz que podemos ter, em alguns setores, novas reestruturações e verticalizações, assim como, em outros setores, pode fazer sentido horizontalizar.
Westrup explica que, hoje, cada setor arrecada um percentual que compõe o total da arrecadação, formando a chamada neutralidade tributária — ou, no fim das contas, a neutralidade arrecadatória. Ou seja, tivemos uma Reformacom neutralidade de arrecadação, mas, dentro desse contexto, alguns setores serão beneficiados e outros acabarão sendo prejudicados em termos de carga tributária.
Do ponto de vista setorial, quando a Tendências olha para isso — e os analistas estão acostumados a fazer estudos de impacto de políticas públicas sobre determinados setores — o cenário muda.
Os impactos serão em todos os setores ao mesmo tempo, então a incerteza permanece. O que já se sabe, de forma mais concreta, são as regras para cada setor se organizar.
Westrup diz que é importante destacar a existência da alíquota de referência e dos redutores aplicáveis a determinados setores. No caso dos serviços prestados por profissionais liberais, por exemplo, há uma redução de 30%, exceto para a área da saúde. Aqui, Westrup explica que estamos falando de advogados, contadores, economistas, engenheiros — ou seja, há um redutor de 30% na alíquota de referência para esses serviços.
Há também uma discussão sobre a aplicação dessa regra: no caso de pessoas físicas, tudo bem, mas quando se trata de pessoas jurídicas, ainda há dúvida se essas empresas precisarão ser uniprofissionais ou não para poder usufruir do redutor.
Houve ainda, de acordo com Westrup, uma redução de 40% na alíquota de referência para bares, lanchonetes e serviços de hotelaria. A Tendências entendeu essa medida como algo justo — inclusive, chegou a atuar um pouco no advocacy para esse setor. Isso porque é um segmento voltado ao consumo e que está no fim da cadeia produtiva. Além disso, trata-se de um setor de serviços com características muito próprias, o que o diferencia em relação ao restante da economia.
Quando falamos sobre o redutor da alíquota de referência, Westrup explica que ele tem um efeito importante: ao reduzir a alíquota sobre o faturamento, também se reduz o crédito para o tomador. Ou seja, quando estamos falando, por exemplo, do setor de bares e lanchonetes, esse redutor incide diretamente sobre o consumidor final — e, nesse caso, o consumidor não gera crédito tributário.
Mas, quando estamos falando de um elo intermediário da cadeia — por exemplo, de um insumo agrícola — há uma lógica diferente. Alguns insumos ficaram com redutor de 60%. Assim, quando uma agroindústria compra um insumo agrícola, ela está adquirindo esse produto já com o redutor de 60%. Consequentemente, o crédito que ela poderá aproveitar será exatamente o valor pago, ou seja, a alíquota efetiva reduzida em 60%.
Westrup diz que há um ponto importante quando falamos sobre redutores: o caso da Construção Civil. O setor ficou com um redutor de 50% na alíquota, mas ainda conta com outros redutores adicionais.
Confira a Parte 1 do podcast na íntegra no vídeo abaixo!
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