Taxonomia Sustentável Brasileira: divisor de águas para destravar investimentos verdes – Jota
- Na Mídia
- 06/10/2025
- Tendências

Agenda exige diálogo contínuo entre setores público e privado para consolidar país como referência em sustentabilidade regulatória
Por Fabiana Tito*
No final de agosto, o Brasil aprovou a Taxonomia Sustentável Brasileira (TSB), um sistema de classificação regulatória das atividades econômicas consideradas sustentáveis. Mais do que um catálogo, trata-se de um marco regulatório que define, por critérios, quais atividades, ativos financeiros e projetos contribuem para objetivos ambientais, econômicos e sociais definidos pela sociedade brasileira.
A TSB integra a agenda estratégica do Novo Brasil – Plano de Transformação Ecológica, tornando-se um dos instrumentos prioritários do Ministério da Fazenda que orienta a transição da economia nacional rumo à sustentabilidade.
O processo de elaboração da taxonomia envolveu um diálogo interinstitucional ao longo de quase dois anos por reguladores, representantes do setor privado e sociedade civil. O engajamento foi robusto: mais de 350 pessoas participaram, houve consulta pública entre novembro de 2024 e março de 2025, com quase 5.000 contribuições, e um comitê consultivo de 18 organizações-chave dos setores financeiro, industrial e agropecuário.
Atendendo a demandas de diversos setores e à experiência internacional, a adoção inicial da taxonomia será voluntária, evitando custos desproporcionais para agentes econômicos e permitindo adaptação gradual ao marco regulatório.
O principal objetivo da TSB é estabelecer princípios regulatórios claros e uniformes para orientar empresas, órgãos públicos e investidores a direcionar recursos para atividades com impacto positivo socioambiental comprovado. No cenário internacional, a harmonização regulatória é estratégica, pois a proliferação de taxonomias sem coordenação dificulta a captação de capitais estrangeiros e aumenta as incertezas.
Sob a ótica regulatória e institucional, critérios claros e compartilhados são essenciais para a previsibilidade dos investidores, a transparência das empresas e a análise objetiva da conduta dos agentes econômicos. A taxonomia pode, inclusive, servir de referência para políticas públicas, como o mercado de carbono, títulos verdes e linhas de crédito sustentáveis.
Outro aspecto central é a mitigação da assimetria de informações nesse mercado entre financiadores, sociedade e empresas. Com critérios objetivos para rotular atividades sustentáveis, reduz-se a dificuldade de verificação, combate-se o risco de greenwashing e facilita-se a avaliação dos investimentos, tornando o mercado mais transparente e confiável. Trata-se de um avanço importante na organização de um mercado afetado por informações incompletas ou distorcidas.
O desenho da TSB é estruturado em três pilares: objetivos, setores e critérios técnicos gerais. Dos 11 objetivos iniciais — entre eles, mitigação e adaptação à mudança do clima, redução de desigualdades, proteção da biodiversidade e promoção da economia circular, entre outros — apenas os três primeiros foram priorizados na versão inaugural, alinhada ao foco global em clima e inclusão social.
Para fins regulatórios, a taxonomia contempla oito grandes setores da economia, como agropecuária, indústria, energia e serviços sociais (turismo, planejamento e desenvolvimento, e tecnologias). Cada setor está sujeito a critérios técnicos baseados em evidências, que avaliam sua contribuição sustentável.
Do ponto de vista das obrigações mínimas, o marco regulatório exige que atividades, empresas ou ativos financeiros listados pela taxonomia demonstrem contribuição substancial a pelo menos um dos objetivos prioritários, além de não prejudicarem outros objetivos e seguirem salvaguardas ambientais e sociais mínimas. Essa lógica busca evitar riscos de greenwashing e garantir o efetivo compromisso dos agentes econômicos com a agenda verde.
O desafio regulatório reside na implementação: órgãos como Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Banco Central e ministérios setoriais terão papel-chave no acompanhamento e aprimoramento da taxonomia. Diálogo com o setor privado, transparência e atualização contínua serão vitais para aumentar a atratividade do Brasil no mercado global de ativos sustentáveis e garantir segurança jurídica a empresas e investidores.
O Ministério da Fazenda prevê um decreto para regulamentar a TSB, reforçando seu caráter voluntário e prevendo instrumentos como rotulagem de produtos financeiros, monitoramento, relato e verificação (MRV) das empresas, benefícios creditícios e fiscais, aplicação em compras públicas e referência para padrões internacionais. A medida visa fortalecer a segurança jurídica e ampliar o uso da taxonomia, promovendo um ambiente mais propício ao investimento verde e ao alinhamento internacional.
O documento final da TSB, previsto para publicação em breve, trará mais de 800 páginas técnicas detalhando critérios e fundamentos do novo marco para sustentabilidade no Brasil. Com isso, o país fortalece sua governança ambiental e se posiciona para atrair investimentos sustentáveis. Contudo, a agenda ainda enfrenta resistências e desafios de implementação, exigindo diálogo contínuo entre os setores público e privado para que seus benefícios superem barreiras e consolidem o Brasil como referência em sustentabilidade regulatória.
*Fabiana Tito é sócia e diretora de Novos Negócios da Tendências Consultoria. Doutora em Economia pela FEA/USP, é especialista em defesa da concorrência. Maratonista, foi a 7ª mulher brasileira a ter concluído o circuito World Marathon Majors (WMM)
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