Tendências Consultoria Econômica

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Saldo credor em favor da cadeia – Jota

O que o PLP 122/25 propõe para quitar CBS/IBS do fornecedor

Por Mário Nazzari Westrup* e Guilherme Venturini Floresti**

A reforma tributária reposiciona a tributação do consumo com a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) sob a lógica da não cumulatividade ampla, na qual o direito do adquirente ao crédito se vincula à constituição tempestiva e regular do débito no elo anterior.

Já na fase de transição, a migração para CBS e IBS, a cobrança no destino, o split payment e a apuração eletrônica elevam o risco de desencontro entre eventos de débito e crédito, ampliando a pressão de caixa sempre que o débito do fornecedor não nasce no tempo ou valor corretos.

Isso porque, no arranjo desenhado pela Emenda Constitucional 132 de 2023 e pela Lei Complementar 214 de 2025, o crédito do adquirente está vinculado, conforme as regras aplicáveis, ao pagamento regular do débito pelo fornecedor. Se o fornecedor não recolher corretamente, o crédito do adquirente pode ficar comprometido, mesmo que a operação econômica tenha ocorrido. O resultado será ruim para o caixa: o adquirente precisará honrar a compra, financiar o tributo e ainda pode enfrentar atraso ou questionamento do seu crédito.

O PLP 122/2025 oferece uma saída pragmática para evitar esse efeito. A proposta autoriza o adquirente a usar o próprio saldo credor de CBS e IBS para quitar o débito correspondente do fornecedor naquela operação de fornecimento. Ou seja, o adquirente direciona seus créditos para abater o tributo devido pelo fornecedor, preservando a simetria da não cumulatividade e evitando que a inadimplência tributária de um elo destrua o crédito do elo seguinte.

A mecânica sugerida pelo PLP 122/2025, que propõe alterar o art. 55 da LC 214/2025, exige lastro documental e trilha digital: o fornecedor emite a nota com menção expressa ao uso de créditos do adquirente e consente eletronicamente; o adquirente declara a compensação no sistema da CBS e do IBS; e a autoridade concede validação à operação e extingue o débito até o limite do crédito utilizado.

Se restar diferença, o fornecedor permanece responsável pelo saldo a pagar, inclusive com os ônus devidos. A cadeia mantém o crédito do adquirente e o fisco recebe, evitando que a inadimplência do fornecedor se propague como ruptura de caixa ao longo da cadeia.

Os benefícios potenciais são claros. O adquirente reduz o tempo de permanência de créditos no ativo, melhora o giro e protege sua apropriação legítima do crédito. O fornecedor continua responsável pelo débito, mas sem transferir risco fiscal ao seu cliente e, potencialmente, ao consumidor. A economia real perde menos energia em pedidos de ressarcimento e em revisões administrativas, ganha previsibilidade nos cronogramas de recebimento e pode precificar com maior clareza os efeitos tributários nas negociações comerciais.

No entanto, há riscos que merecem atenção. A compensação ajuda a preservar o crédito do adquirente, mas se a prática se tornar recorrente, pode deslocar liquidez e risco de crédito para o adquirente ao financiar constantemente o recolhimento do elo anterior. Quando o volume compensado supera a capacidade de geração de créditos, cria-se dependência de poucos clientes e do ritmo de geração desses próprios créditos.

Para além de um problema relativo ao deslocamento do risco ao adquirente, o uso ampliado dos créditos pode gerar distorções relevantes. Ao transformar o crédito tributário em meio de pagamento entre empresas, abre-se espaço para práticas de “monetização” desses saldos (permitindo, por exemplo, que grandes contribuintes utilizem seus créditos para negociar descontos de fornecedores em situação fiscal irregular). Em larga escala, isso cria uma espécie de moeda paralela dentro da economia formal, resultando em um sistema menos transparente, com maior risco fiscal agregado e aumentando o poder de mercado dos grandes contribuintes.

Além disso, para que a compensação não seja utilizada de forma indevida (por exemplo, através de crédito gerado fraudulentamente) é essencial que o sistema eletrônico responsável pela operação consiga validar, de forma tempestiva, os saldos devedores do fornecedor e credores do adquirente. Para isso, o sistema deve ser capaz de cruzar as informações das partes em tempo real e dispor de mecanismos de controle adequados, como campos de anuência eletrônica do fornecedor.

Portanto, o mecanismo sugerido pelo PLP 122/2025 ganhará mais robustez se se aplicar limites de uso, elegibilidade por parceiro, conciliações e registro claro do vínculo entre operação, imposto destacado e compromisso de extinção do débito. O uso de saldos credores para quitar débitos do fornecedor, se aprovado com salvaguardas e boa regulação, alinha a não cumulatividade com a realidade financeira das cadeias, criando uma alternativa para evitar que a falha de um elo comprometa o fluxo de todos os outros da cadeia.

*Mário Nazzari Westrup é consultor da Tendências Consultoria. Doutor e mestre em Desenvolvimento Socioeconômico pela Unesc, possui MBAs em Gestão Financeira, Controladoria e Auditoria pela FGV e em Finanças e Mercado de Capitais pelo Instituto de Finanças de Nova York. Bacharel em Ciências Contábeis pela Unesc e em Relações Internacionais pela Unisul

**Guilherme Venturini Floresti é consultor da Tendências Consultoria. Pós-graduado em Direito Tributário pela PUC-SP. Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo e em Ciências Econômicas da UFABC

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