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Pressão na Previdência vai além de congelar o salário mínimo – Folha de S. Paulo

Solução seria desvincular de vez o piso dos gastos previdenciários, que impõem concessão de ganhos reais a quem já deixou o mercado de trabalho

Por Maílson da Nóbrega – Ex-ministro da Fazenda (1988-1990, governo Sarney), é sócio da Tendências Consultoria

Ao falar na “Brazil Conference and MIT”, em Boston (12/4/2025), o ex-presidente do Banco Central Arminio Fraga defendeu o congelamento do salário mínimo por seis anos, com reajuste apenas pela inflação do ano anterior. Desse modo, a medida abrangeria os dois anos finais do atual mandato do presidente Lula e mais quatro anos, caso ele venha a ser reeleito em 2026. O objetivo seria deter, nesse período, a trajetória explosiva dos gastos previdenciários. Corresponderia a um ajuste fiscal de 1% do PIB no período.

Arminio mexeu em um vespeiro. Sua ideia repercutiu negativamente nas redes sociais, onde foi tachado de insensível e de outros adjetivos. A Associação Brasileira de Economistas pela Democracia (Abed) repudiou publicamente a proposta, “de forma contundente”, e a considerou “elitista, cruel e inaceitável”.


Seria, afirmou, “a lógica de sempre: o povo paga a conta, enquanto os rentistas continuam sangrando o país com juros escorchantes e lucros recordes”. Em vez de usar a “contundência” do discurso fácil da velha esquerda, os economistas da Abed fariam melhor se tivessem estudado o assunto. Poderiam convencer-se de que a manutenção da regra que vincula o salário mínimo aos gastos previdenciários é uma bomba-relógio que, se não desarmada, explodirá no colo dos trabalhadores via corrosão inflacionária de seus rendimentos.

Quem tiver estudado o mínimo sobre a Previdência Social brasileira sabe que o sistema se tornou insustentável. Consumiu em 2024, segundo cálculos de Raul Velloso, um de nossos melhores especialistas em finanças públicas, 52,5% dos gastos primários da União (22,3% em 1987).

O restabelecimento dos reajustes reais do salário mínimo pelo atual governo terá um impacto de R$ 1,3 trilhão, segundo a ministra do Planejamento, Simone Tebet. Há estimativas menores, mas as economias previstas na reforma da Previdência (2019) vão desaparecer.

Há muitas esquisitices envolvendo o tema. A principal é a vinculação dos benefícios ao salário mínimo, o que implica a concessão de ganhos reais a pessoas que deixaram o mercado de trabalho. Dificilmente isso acontece em outro país. O normal, inclusive nas nações ricas, é preservar o valor real dos benefícios, reajustando-os pela inflação. Elevações reais constituem uma atribuição aos trabalhadores de parte ou da totalidade dos ganhos de produtividade, o que não cabe aplicar a quem não trabalha. Existe até um Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos, citado no recente escândalo do desconto ilegal de contribuições de aposentados e pensionistas.

Segundo o dicionário Houaiss, sindicato é uma “associação que agrupa trabalhadores da mesma profissão ou ramo de atividade para defesa de seus interesses comuns”. Para o Dieese, os sindicatos “são instrumentos essenciais para a luta em defesa dos interesses dos trabalhadores na relação reconhecidamente conflitiva e assimétrica entre capital e trabalho”. Em qualquer outra definição sobre o tema, a palavra comum é “trabalhador”, nunca aposentado.

Voltando à proposta de Arminio, ela faz sentido, mas mantém o problema da equivocada indexação do salário mínimo aos benefícios previdenciários. Passados os seis anos, a questão retornaria ao palco.

Reaceleraria os respectivos gastos, agravando a já insustentável situação da Previdência. Na verdade, é preciso uma solução definitiva, o que só virá mediante a revogação do artigo 201, § 2º da Constituição, pelo qual nenhum benefício “terá valor mensal inferior ao salário mínimo”.

Muitos temem que a norma seja considerada cláusula pétrea pelo Supremo Tribunal Federal, o que impactaria negativamente as expectativas. Pode-se, todavia, invocar o argumento de que uma regra não pode arruinar o país, que seria a consequência de manter a vinculação. Como vantagem, seriam mantidos os reajustes reais do salário mínimo, de preferência de acordo com a expansão da produtividade.

Reprodução. Confira o original clicando aqui!