Tendências Consultoria Econômica

  • Português
  • English
Edit Template

O que está por trás da perda de fôlego da economia brasileira? – BandNews

Em entrevista ao BandNews, Alessandra Ribeiro, sócia e economista da Tendências Consultoria, comenta os fatores que estão por trás da perda de fôlego da economia brasileira

Alessandra explica que, apesar de juros elevados e o crédito mais caro, o movimento natural de necessidade de evolução das empresas e de investir em novas tecnologias ainda é visto como uma força muito importante no comportamento de serviços, junto ainda com os resquícios do agro na parte de transportes.

Ela pontua que temos, também, o peso importante do mercado de trabalho e crescimento da renda sustentando linhas de serviços, como a parte de viagens, incluindo passagens aéreas. Isso tudo também está refletido na resiliência do setor de serviços.

Devido aos diferentes elementos, tanto do lado de famílias quanto do lado de empresas, Alessandra diz que vemos essa resiliência do setor de serviços no segundo trimestre, praticamente mantendo o mesmo ritmo do primeiro trimestre.

Ela levanta o questionamento: o setor de serviços vai manter essa resiliência daqui para a frente? Em seguida, ela mesma responde dizendo que a avaliação da Tendências é que não.

“Como uma parte disso ainda tem resquício do agro e tem também o efeito do mercado de trabalho resiliente no consumo de serviços das famílias, isso deve também perder tração ao longo do tempo, porque o mercado de trabalho reage com defasagem à perda de tração da atividade econômica. Então, com esse momento da atividade econômica, a gente vai ver o mercado de trabalho também com tendência de desaceleração e isso também afetará o consumo das famílias.”, explica Alessandra.

Mercado de trabalho

Alessandra explica que, na dinâmica do mercado de trabalho, existem elementos e elementos estruturais.

O elemento conjuntural tem a ver com a atividade econômica crescendo, o que afeta o mercado de trabalho via geração de mais postos de trabalho e aumento dos salários. 

Sobre os elementos estruturais, Alessandra diz que tem a ver com pontos relacionados às mudanças na estrutura, como, por exemplo, a Reforma Trabalhista de 2017, em que foram criadas modalidades de trabalho que facilitam contratações.

Essas questões mais estruturais, explicam, também uma parte da performance muito positiva do mercado de trabalho nos últimos anos.

Alessandra diz que é por isso que, inclusive pensando nessa trajetória dos próximos trimestres e também em 2026 e 2027, é possível observar que o elemento conjuntural fará com que o mercado de trabalho tenha uma perda de força, gerando uma redução no ritmo de geração de postos de trabalho e também no ritmo de crescimento dos salários. 

Entretanto, Alessandra diz que, apesar dessa parte conjuntural vir, todos os elementos estruturais existentes farão com que sejam evitados aumentos, por exemplo, muito expressivos da taxa de desemprego. 

Corte nas taxas de juros

Nessa trajetória, considerando inflação e atividade econômica, Alessandra diz que tivemos notícias mais positivas do lado inflacionário, com uma parte dessa história passando pelo câmbio mais apreciado aqui no Brasil e outra parte sendo relacionada à queda de preços de commodities que tivemos nos últimos períodos, trazendo resultados mais favoráveis para a nossa inflação.

Entretanto, apesar das notícias positivas, Alessandra diz que ainda estamos longe da meta perseguida pelo Banco Central, que é de 3%. As revisões da Tendências ainda apontam uma inflação acima do teto da meta neste ano, mas na casa de 4,9%. 

“Mesmo com revisões mais positivas, ainda há uma inflação na casa de 4% no ano que vem, ou seja, ainda há uma distância do centro da meta, que é 3%. E os sinais de desaceleração de fato estão aparecendo. A gente já vê o reflexo da política monetária, mas é uma desaceleração que está vindo em linha com o esperado e sem maiores surpresas.”, explica Alessandra.

Ela ainda diz que existem alguns sinais incipientes de desaceleração, mas ainda com um mercado de trabalho muito resiliente. E, juntando as duas pontas, vemos um Banco Central ainda muito cauteloso nesse processo de redução de juros.

“A gente mantém ainda a cabeça de que um primeiro movimento de queda deve acontecer a partir do começo do ano que vem (…) e aí ele (O Banco Central) seguirá reduzindo essa Selic um pouco mais para casa de 13% e até um pouco abaixo disso, mas apenas ligeiramente abaixo, sem vermos muito espaço para ser mais agressivo com a taxa básica de juros nesse período.”, aponta Alessandra.

Previsões para o futuro

Alessandra diz que temos um cenário externo bastante desafiador, principalmente em relação ao ex-presidente Bolsonaro. Pode haver risco de mais repercussões para a economia brasileira, tanto do ponto de vista de tarifas, quanto especificamente a membros do judiciário e do governo.

Ela explica que o que nos salva é o fato de termos uma exposição ao mercado americano até relativamente pequena, olhando de forma agregada. Ela fala de 2% do nosso PIB sendo exportado pros Estados Unidos, mas é fato que, para alguns setores, temos uma exposição maior, e isso terá um reflexo mais expressivo 

Sobre o cenário doméstico, Alessandra diz ver o governo reagindo, seja com linhas de crédito e programas para ajudar setores mais afetados pelo cenário externo, como também com medidas para impulsionar o consumo das famílias.

Sobre 2026, Alessandra diz que a Tendências está vendo um cenário bastante desafiador. O governo deve cumprir o limite inferior da meta em 2025, mas a consultoria está vendo bastante dificuldade para 2026 no cumprimento dela.

Isso porque existe uma dinâmica muito adversa de crescimento de gastos obrigatórios e, infelizmente, não há nenhuma agenda sendo discutida, nem pelo Executivo, nem pelo Congresso, de maneira articulada para tentar direcionar essa questão.

Alessandra diz que chegaremos em 2027 com uma situação fiscal extremamente difícil, sem ter espaço para a execução de despesas básicas da máquina pública, podendo ter um risco de shutdown, como se fala em inglês, que é uma paralisação de funcionamento de serviços públicos porque não há recurso. Alessandra acredita que, infelizmente, estamos caminhando para isso sem nenhuma agenda para lidar com isso — e não deve vir por causa do período eleitoral.

Ela ainda diz que, para aumentarmos essa capacidade de crescimento, precisamos ter mais investimentos de diversas ordens: desde capacidade produtiva até infraestrutura, além de investimentos em educação e em melhorar o ambiente de negócios, tornando-o mais célere e mais eficiente, por exemplo.

É preciso lembrar que um dos grandes pilares da capacidade de crescimento de um país passa pela mão de obra e pela qualificação dela, o que tem a ver com educação de qualidade.

Mas, para fazer isso, Alessandra diz que precisamos de recursos. E um dos grandes limitadores para termos essa disponibilidade de recursos para maiores investimentos tem a ver com a parte fiscal, porque, no fundo, temos um déficit — déficit primário, déficit nominal — e, para fechar isso, acabamos emitindo dívidas para conseguir arcar com essas despesas e não há poupança pública para suprir essa necessidade.

Um dos caminhos, de acordo com Alessandra, é reduzir primeiro essa despoupança pública para que haja mais recursos para investimentos.

“Obviamente, tem uma parte disso que passa por quantidade de poupança a ser investida e outra parte por garantir a qualidade desses investimentos, seja na qualificação de mão de obra, seja na capacidade produtiva e infraestrutura. Ou seja, voltamos sempre para a mesma discussão: o fiscal é uma das variáveis mais sensíveis mesmo.”

O problema, de acordo com Alessandra, é realmente tirar do papel, executar, viabilizar politicamente essa construção e dar continuidade, porque, independentemente de qual governo seja, a agenda precisa continuar.

“É isso que se espera quando vamos para uma próxima eleição. A agenda está aí, ela é conhecida, não é novidade, mas precisamos ter força política para tirar do papel e enfrentar discussões difíceis.”, finaliza Alessandra.

Confira a entrevista completa no vídeo abaixo!