O que deve acontecer com o mercado de trabalho em 2024 – Estadão
- Na Mídia
- 21/03/2024
- Tendências
Desaceleração do PIB esperada para 2024 e programas assistenciais de transferência de renda sem aumentos expressivos podem levar um número maior de pessoas de volta ao mercado; expectativa é que a taxa de desemprego ultrapasse 8% este ano
Os bons indicadores do mercado de trabalho em 2023 não devem se repetir em 2024, na avaliação de especialistas. O ano passado encerrou com desemprego médio de 7,8%, a menor taxa em quase dez anos, desde 2014, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Mais de 100 milhões de brasileiros estavam ocupados no ano passado – um nível recorde – e a renda média real do trabalho aumentou 7,9% ante 2022.
A desaceleração do Produto Interno Bruto (PIB) esperada para 2024, – um crescimento por volta de 1,7%, ante 2,9% registrado em 2023 – e a falta de incremento significativo nos programas assistenciais de transferência de renda devem aumentar o número brasileiros em busca de trabalho neste ano, preveem especialistas em mercado de trabalho. E isso deve resultar no crescimento da desocupação, uma vez que a taxa de desemprego considera as pessoas que estão à procura de trabalho e não conseguem em relação à População Economicamente Ativa (PEA).
Nas contas do economista Bruno Imaizumi, da LCA Consultores, a taxa média de desemprego neste ano deve oscilar entre 8,1% e 8,2%. Serão 330 mil brasileiros a mais em busca de trabalho, em média, ao longo de 2024.
“A queda da taxa de desemprego que houve no ano passado não reflete um mercado de trabalho plenamente recuperado”, afirma o economista Lucas Assis, da Tendências Consultoria Integrada.
Em 2022, a taxa média de desemprego havia sido de 9,6%, quase dois pontos acima da registrada em 2023. Para este ano, Assis projeta aumento do desemprego a cada mês. No entanto, por causa de diferenças amostrais da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) mensal e anual, a taxa média anual de desocupação deve ficar em 7,8% este ano e subir para 8,3% em 2025, segundo o economista.
Dois fatores explicam, na análise de Assis, o forte recuo que houve no desemprego no ano passado. Um deles foi o aumento da ocupação. O outro, a menor procura por trabalho.
“O nível de ocupação foi bastante elevado, mas era esperado”, observa Imaizumi. Isso porque a população brasileira cresce e há mais pessoas em idade de trabalhar. Também em 2023 houve um número maior de trabalhadores que voltaram a se empregar com carteira assinada, após a crise da pandemia.
Fabio Bentes, economista da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), atribui a recuperação da ocupação ao setor de serviços, duramente afetado pela covid-19 e, atualmente, o maior empregador da economia brasileira. “Das 27 unidades da federação, só duas tiveram queda no desempenho do setor de serviços no ano passado”, observa. E isso acaba demandando mais mão de obra.
Apesar de o número de trabalhadores ocupados na economia como um todo ter batido recorde em 2023, Assis, da Tendências, ressalta que a fatia de ocupados no total da população em idade de trabalhar ficou em 57,6% no ano passado. É um resultado abaixo dos anos de crise de 2015 e 2016. O maior nível de ocupação nessa métrica foi 58,3%, atingido em 2013. “Isso sugere uma ociosidade parcial do mercado de trabalho e, em termos demográficos, ainda há espaço para crescimento da população ocupada.”
Transferência de renda
Depois de três anos sem reajustes acima da inflação, o salário mínimo voltou a ter ganhos reais em 2023. O salário mínimo é o indexador dos rendimentos de uma série de programas sociais de transferência de renda, além das aposentadorias e outros benefícios.
Na análise de Assis, essa renda maior nos arranjos familiares gerou um desincentivo à busca por ocupação em 2023, diminuindo a taxa de desemprego. Também a melhora da renda dos que estavam ativos no mercado de trabalho permitiu que outras pessoas da família se dedicassem a atividades não remuneradas, como afazeres domésticos e estudos, observa.
“A injeção de recursos via transferência de renda acabou camuflando o cenário do emprego que não é necessariamente otimista. Isso fez com que a taxa de desemprego caísse, não em razão de um mercado de trabalho recuperado”, afirma o economista da Tendências.
Falta de investimento
Na opinião do economista Fabio Silveira, sócio da consultoria MacroSector, a melhora que houve no mercado de trabalho no ano passado não deverá perdurar este ano porque o nível de investimento na economia hoje é baixo. Em 2023, a Formação Bruta de Capital Fixo, que é o indicador de investimento, atingiu 16,5% do PIB, com recuo de 1,3 ponto ante 2022. “A melhora que houve em 2023 do emprego refletiu um mercado saindo do buraco provocado pela pandemia.”
Ele acrescenta que em 2022 começou a ocorrer alguma recuperação de vários setores, mas de forma heterogênea. “Há segmentos da indústria ainda muito deprimidos, especialmente de bens semiduráveis.” Essa retomada errática travou a recuperação do emprego, especialmente, dos postos de trabalho mais qualificados, para ocupações que envolvam tecnologia e engenharia, por exemplo.
Ana Paula Prado, CEO do Infojobs, uma das gigantes do setor de recrutamento e seleção de trabalhadores, diz que, embora a tecnologia tenha fornecido ferramentas para encontrar talentos, ainda há escassez de profissionais qualificados.
Segundo ela, dados do IBGE de 2023 indicam uma lacuna de aproximadamente 1,5 milhão de empregos não preenchidos, especialmente em setores como tecnologia, saúde e engenharia. “Isso coloca os recrutadores em uma corrida contra o tempo na busca por talentos capacitados.”
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