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MP traz compensações para substituir arrecadação menor do IOF – Times Brasil

Em entrevista para a Times Brasil, a sócia e diretora de Macroeconomia e Análise Setorial da Tendências, Alessandra Ribeiro, comenta sobre os potenciais impactos para a economia brasileira da medida provisória assinada recentemente pelo presidente Lula.

LCA e LCI

A LCA e a LCI eram isentas de imposto de renda e, a partir de agora, estariam sujeitos a uma alíquota de 5%. Ao ser questionada sobre quais são as implicações dessa mudança, especialmente se levarmos em consideração o mercado de crédito imobiliário e agropecuário, Alessandra explica que, ainda assim, elas continuam sendo bastante incentivadas quando comparadas a outros tipos de investimento.

Entretanto, ela reforça que é fato que, ao comparar com a situação anterior de isenção, esse novo imposto pode minimizar a demanda por esse tipo de instrumento, gerando também uma menor captação para esses segmentos.

“Deve ter, claro, algum efeito no mercado de capitais, porque esses instrumentos estão sendo muito utilizados, junto com as debêntures. Temos observado um crescimento expressivo das emissões através desses instrumentos todos e, obviamente, haverá algum efeito de moderação na demanda por esse tipo de letra, o que significa um crédito um pouco mais restrito.”

Alíquota do Imposto de Renda

O governo anunciou também uma medida provisória que unifica a alíquota de Imposto de Renda em 17,5% para renda fixa e variável. Sobre essa mudança poder ou não impactar o comportamento dos investidores a partir de 2026, Alessandra diz que, de fato, agora não temos mais o escalonamento e há uma uniformização das alíquotas.

Ela explica que, na verdade, o que vai determinar a demanda por renda variável ou renda fixa, a partir dessa mudança, são os fundamentos e a expectativa de ganho. Ou seja, não será mais a tributação que definirá a alocação entre renda fixa ou variável, mas sim os fundamentos por trás desses mercados e a expectativa de rentabilidade.

Alessandra também pontua que, assim como em outros mercados, há competição. Muitas vezes vemos que, quando há menor apetite pela Bolsa, os agentes alocam mais recursos na renda fixa. Ela vê isso como uma movimentação normal entre diferentes instrumentos financeiros diferentes, que são guiados por fundamentos econômicos e expectativas de rentabilidade e não por questões tributárias, o que é o ideal do ponto de vista econômico.

O governo está fragilizado?

Ao ser questionada se enxerga o governo bastante fragilizado e tendo que correr atrás do prejuízo para a reeleição, Alessandra pontua que começamos este governo com um aumento muito expressivo das despesas, que veio já com a PEC da Transição, lá no final de 2022 para 2023, e depois com algumas medidas, como o próprio debate sobre o novo arcabouço fiscal. Ainda que ele imponha um limite para o crescimento das despesas, o fato é que as medidas adotadas, como a regra do salário mínimo e sua vinculação com benefícios previdenciários, o piso mínimo para investimentos e a volta do piso constitucional para saúde e educação, entre outras, deixaram a situação fiscal mais difícil.

“Vemos um crescimento muito expressivo das despesas obrigatórias. Com essas despesas crescendo em ritmo mais acelerado e um limite de crescimento imposto pelo arcabouço fiscal, ocorre um achatamento das despesas discricionárias. É uma dinâmica extremamente complicada, porque as estimativas mostram que, em 2027, essas despesas discricionárias estarão muito achatadas, comprometendo a continuidade de diversos serviços públicos.”

Alessandra diz que a situação é muito difícil. O governo não consegue fechar as contas de 2025 e, principalmente, de 2026. Ao mesmo tempo, não há disposição para realizar reformas estruturais que alterem essa dinâmica. Também não vemos, por parte do Congresso, boa vontade para tratar desses temas mais sensíveis.

IOF

Sobre o novo decreto que foi editado pelo governo, tentando corrigir o primeiro, que elevou o IOF e teve reação muito negativa, Alessandra diz que o governo tentou, com essa calibragem do IOF, amenizar pontos muito sensíveis, que impactariam principalmente o crédito às empresas.

A Tendências fez algumas simulações com base na versão inicial e os efeitos para o crédito corporativo em 2025 e 2026 seriam significativos — uma redução de cerca de R$ 38 bilhões, com impacto relevante no crescimento econômico.

Tentou-se, então, calibrar essa parte, no novo decreto, embora outros pontos da versão antiga ainda permaneçam. Há impacto nos fluxos de investimento ao exterior, entre outras questões. Na avaliação da Tendências, houve, sim, um objetivo arrecadatório. O governo tenta atingir, pelo menos, o limite inferior das metas fiscais de 2025 e 2026 e escolheu o caminho mais fácil: alterar o IOF. Houve erros, porque os efeitos para o crédito corporativo, por exemplo, foram muito negativos. Por isso, o governo precisou recuar.

Mas o ponto central, de acordo com Alessandra, é que essa é uma solução pontual para fechar as contas no curtíssimo prazo e longe de representar uma solução estrutural para as contas públicas. E o que precisamos é justamente de uma solução estrutural, frente à dinâmica de endividamento público crescente em relação ao PIB.

“Gambiarras” do governo

Alessandra lembra que para 2026, um cenário ainda mais desafiador, estima-se arrecadar cerca de R$ 20 bilhões. Mas existem riscos: esses números podem não se concretizar.

“E aí, qual é o ponto? O governo não entrega nem o limite inferior das metas estabelecidas. Qual o caminho natural? Bloqueios e contingenciamentos. Acho que isso vai acontecer. É uma saída natural. Politicamente, é difícil, sensível, especialmente porque impacta as emendas parlamentares, tornando a situação política mais complicada. Mas esse é o caminho mais provável.”

Alessandra diz que a outra possibilidade é a antecipação de dividendos. Já vimos isso outras vezes, inclusive muito no final de 2022, no ambiente de disputa eleitoral. Recursos que seriam pagos pelas estatais em 2023 foram apropriados nas contas de 2022. Esse é um mecanismo já utilizado por diferentes governos.

Confira a entrevista completa no vídeo abaixo!