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Fim do casamento ou da lua de mel entre investimentos e ESG? – Exame

Há uma série de eventos e decisões que levam ao questionamento sobre a consistência e até mesmo sobre o avanço da agenda ESG no Brasil

Por Mariana Palandi M. Pacheco*

No meu último artigo, apontei dados do estudo desenvolvido pela International Energy Agency (IEA) sobre os investimentos globais em energia, publicado em maio de 2023. De acordo com o estudo, no mundo todo, apesar de o investimento em novas usinas a carvão seguir tendência de queda, em 2022 soou um sinal de alerta com 40 GW de novas usinas a carvão sendo aprovadas, quase todas na China. No Brasil, a discussão sobre a exploração pela Petrobras da Foz do Amazonas também parece ir na contramão da urgência da transição energética que a pauta ambiental pretende. De acordo com a IEA, o discurso da Petrobras de “tirar a última gota de petróleo do mundo” gera um atraso significativo nas ações contra as mudanças climáticas desenhadas. 

Recentemente, a Shell anunciou o abandono do plano de reduzir entre 1% e 2% ao ano os volumes de combustíveis fósseis produzidos até 2030, diante do maior lucro em 116 anos, resultante do aumento de preço do petróleo devido à guerra na Ucrânia. Essa decisão é uma clara sinalização ao mercado de que priorizaria os lucros de curto prazo e a remuneração dos acionistas (shareholders) ao invés de endereçar a preocupação dos seus principais stakeholders. 

O novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), lançado pelo Governo Lula em 11 de agosto de 2023, que prevê o investimento de R$ 1,7 trilhão em todos os Estados brasileiros, tem como segundo maior destino de recursos negócios envolvendo “Transição e Segurança Energética” (quase 32% do investimento total previsto). No entanto, quando analisada a destinação desses mais de R$ 540 bilhões, 62% serão voltados ao setor de petróleo e gás, especialmente no desenvolvimento da produção, enquanto apenas 5% serão destinados à produção de energia de baixo carbono. 

A BlackRock, maior gestora de ativos do mundo, que em diversas oportunidades se posicionou alinhada à Teoria dos Stakeholders, destacando que o que diferenciaria as empresas “verdadeiramente excelentes” das demais “é um claro senso de propósito; valores consistentes; e, de forma crucial, reconhecimento da importância de se envolver e atender aos principais stakeholders”, neste ano, posicionou-se de forma muito mais conservadora, indicando que cada cliente tem seu próprio objetivo e perspectivas, sejam eles alinhados ou não à transição energética, de tal forma que a gestora deveria apoiá-los em ambos os casos. Fink, CEO da BlackRock, foi alvo da extrema direita americana, tendo Ron DeSantis, governador da Flórida e provável pré-candidato à presidência, determinado em dezembro de 2022 que o estado retirasse cerca de US$ 2 bilhões aplicados na gestora. 

Há uma série de eventos e decisões tomadas por agentes do mercado e até mesmo pelos governos, relacionados à destinação de recursos de investimentos, que levam ao questionamento sobre a consistência e até mesmo sobre o avanço da agenda ESG no Brasil e no mundo. A preferência pelo lucro ou retorno de curto prazo indica que muito do discurso ESG, em destaque especialmente na pandemia, sobre o alinhamento das decisões estratégicas à Teoria dos Stakeholders, em favor da agenda ESG, pode se mostrar como greenwashing, em que se fala sobre certas medidas, mas não se tornam ações de fato.  

Se os últimos eventos levam ao fim do casamento entre investimentos e ESG ou se representam apenas o término da lua de mel, os próximos capítulos irão dizer. 

*Mariana Palandi Medeiros Pacheco é mestre em Administração de Empresas pelo Insper e Bacharel em Ciências Econômicas pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Possui experiência em estratégia de negócios e finanças corporativas, além de estudar e pesquisar temas relacionados à agenda ESG. Atualmente, atua como consultora na Tendências Consultoria. 

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