Escândalo do INSS derruba Lupi; Lula escolhe número 2 como novo ministro – O Estado de S. Paulo
- Na Mídia
- 05/05/2025
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Desgastado pelas fraudes em aposentadorias e pensões, pedetista anuncia saída; Wolney Queiroz, que assume pasta, participou de reunião em que houve alertas sobre irregularidades
O ministro da Previdência Social, Carlos Lupi (PDT), pediu demissão do cargo ontem, após reunião com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A saída é consequência do escândalo dos descontos indevidos de aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Lupi anunciou seu desligamento por meio de uma publicação na rede social. “Tomo esta decisão com a certeza de que meu nome não foi citado em nenhum momento nas investigações em curso”, disse ele.
Para o lugar de Lupi, Lula convidou o atual secretário executivo da pasta, Wolney Queiroz, que também é um quadro do PDT. A exoneração e a nomeação foram publicadas ontem no Diário Oficial da União (DOU). O Palácio do Planalto avaliou a permanência do ministro como insustentável porque o desligamento de Alessandro Stefanutto da presidência do INSS não aliviou a pressão sobre o governo.
Lupi e o PDT também estavam incomodados com a maneira como o Planalto estava conduzindo a crise. O substituto de Stefanutto no INSS, o procurador Gilberto Waller Júnior, foi escolhido à revelia do ministro – a autarquia é ligada à pasta. A opção por Waller decorre de uma ordem de intervenção de Lula, que se envolveu pessoalmente para tentar conter a crise. Entretanto, as dimensões do escândalo têm fornecido munição política contra o governo no Congresso.
A oposição protocolou pedido de abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara. A instalação depende do presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos PB). Em paralelo, os opositores articulam um pedido de CPI Mista, com a participação de deputados e senadores. A Iniciativa é encabeçada pelo senador Ciro Nogueira (PP-PI).
Investigação
A Polícia Federal e a Controladoria-Geral da União (CGU) realizaram, no dia 23 de abril, a Operação Sem Desconto, fruto de uma investigação que aponta um esquema fraudulento de deduções indevidas em aposentadorias e pensões pagas pelo INSS. Associações e sindicatos faziam descontos em folha dos benefícios a partir de acordos de cooperação técnica firmados com o instituto. Em muitos casos, as retiradas mensais ocorriam sem aval ou ciência do beneficiário.
O valor estimado em cobranças irregulares pode chegar a R$6,3 bilhões entre 2019 e 2024, segundo a PF. Se retroagir a data até 2016, esse valor sobe para quase R$8 bilhões. Apesar de o esquema não ter sido instituído neste governo, a investigação aponta um salto no volume descontado a partir de 2023.
A investigação da PF não aponta responsabilidade de Lupi. No entanto, ele tem sido cobrado por suposta omissão diante de alertas recebidos desde 2023 de órgãos como Tribunal de Contas da União (TCU), CGU e Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS), além de auditores do próprio INSS e da imprensa. O inquérito da PF foi aberto a partir de reportagens do site Metrópoles.
Reportagem do Jornal Nacional, da TV Globo, de 26 de abril, mostrou que Lupi soube das denúncias em junho de 2023, mas demorou quase um ano para tomar medidas. Ele rechaça as acusações de omissão e alega que auditoria realizada pelo órgão seria a “prova cabal” de que ele agiu. A auditoria foi realizada depois do surgimento das denúncias.
Reunião
Os indícios de desvios foram relatados em reunião do CNPS em 2023 por uma conselheira, mas não foram tratados como prioridade. Em sua defesa, o então ministro afirmou que o problema foi apresentado “sem nenhum documento como prova para discutir os abusos que poderiam estar sendo executados”. “Pedi, à época, que o INSS começasse a apurar as denúncias apresentadas. Levou-se tempo demais”, declarou, durante reunião do CNPS na última segunda-feira. O novo ministro da Previdência, Wolney Queiroz, também participou da reunião de 2023. A informação consta da ata do encontro, ocorrido em 12 de junho daquele ano. As investigações confirmaram as desconfianças abordadas na ocasião. Segundo o documento, Lupi registrou que a discussão era relevante, mas, como seria necessário fazer um levantamento dos dados, pediu que o tema fosse pautado para a próxima reunião, o que não aconteceu.
O governo suspendeu todos os convênios com as entidades investigadas e informou que os valores retirados indevidamente serão restituídos.
A troca no Ministério da Previdência é a 11ª mexida no primeiro escalão do atual mandato de Lula e a terceira motivada por algum escândalo. Silvio Almeida, dos Direitos Humanos, foi desligado por investigação sobre assédio sexual e Juscelino Filho, das Comunicações, saiu após ser denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por corrupção.
Base
No Planalto, a saída de Lupi não vinha sendo tratada como trivial, uma vez que ele lidera um dos principais partidos da base fiel do governo e é aliado histórico dos governos petistas – foi ministro nos primeiros mandatos de Lula e no de Dilma Rousseff (PT)
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O líder do PDT na Câmara, Mário Heringer (MG), chegou a dizer que, caso Lula decidisse exonerar Lupi, estaria também tirando o próprio PDT da base. A escolha de Wolney Queiroz, porém, mantém o partido no comando da Previdência. Queiroz foi deputado federal de Pernambuco por seis mandatos, quatro deles consecutivos. Ele foi chamado para assumir o cargo de secretário executivo da pasta ao não conseguir a reeleição em 2022.
Mais vulneráveis
Para o cientista político e sócio da Tendências Consultoria, Rafael Cortez, a saída de Lupi é uma forma de tentar amenizar o desgaste entre um grupo de eleitores caro às chances de reeleição de Lula em 2026: os aposentados. “Tudo isso ocorre num momento em que o governo dizia que 2025 seria o ‘ano da colheita’ – e, na prática, está sendo tomado por agendas negativas”, disse Cortez.
“E,num contexto em que o governo já vinha enfrentando fragilidade política, começando agora a estabilizar uma queda de popularidade, essa crise se torna ainda mais delicada.”
Segundo o cientista político, esse assunto afeta o governo porque envolve o tema corrupção, e não de forma “abstrata”. A crise derivada do escândalo do INSS, observou, atinge algo muito próximo do cotidiano dos eleitores mais vulneráveis. Para ele, há um certo desgaste acumulado: a suposta taxação do Pix, o caso das “blusinhas”, entre outros temas que afetaram negativamente a percepção entre os mais pobres.
Esta é a segunda demissão de Lupi em um governo petista. Em dezembro de 2011, quando era ministro do Trabalho de Dilma, ele saiu na esteira da “faxina” ministerial – foi o sétimo ministro a cair no primeiro ano do governo da petista. Na época, o pedetista foi alvo de diversas denúncias, como a de se beneficiar de convênios irregulares com ONGs e a de ter viajado em jatinho de um dirigente de uma ONG que tinha convênios com a pasta. Ele negou todas as acusações.