Considerações iniciais sobre o impacto da PEC nº 66/2023 sobre as contas públicas
- Macroeconomia e política
- 17/07/2025
- Tendências

Por: João Pedro Leme, consultor da Tendências
Dando continuidade à primazia da pauta fiscal sobre o debate público nacional, o Congresso Nacional, nos últimos dias, tem se debruçado sobre a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 66/2023 – que visa mudar, de forma permanente, o tratamento orçamentário dispensado a parte das despesas com Precatórios e Requisições de Pequeno Valor (RPV).
Arquitetado pelo Dep. Baleia Rossi (MDB-SP) com o auxílio de técnicos do Ministério do Planejamento e Orçamento (MPO) e representantes municipais, o substitutivo do projeto tinha como objetivos principais (i) definir as balizas para a reincorporação dos precatórios da União Federal à meta de resultado primário fiscal; (ii) propor parâmetros para a renegociação de precatórios municipais e estaduais, incluindo novo indexador para tais dívidas; e (iii) estabelecer novos critérios para a quitação de dívidas previdenciárias municipais.
Ainda que tenha sido aprovada na Câmara dos Deputados com margem suficiente (353 x 76), a proposta não passou incólume – a resistência oferecida pela bancada do Partido dos Trabalhadores (PT) acabou forçando a retirada do destaque relativo às dívidas municipais com o RGPS. Com isso, a discussão a ser travada no Senado Federal, na segunda votação que deve ocorrer após o recesso parlamentar, deve ter seus holofotes voltados aos possíveis impactos fiscais trazidos pelos pontos (i) e (ii).
O texto final do Substitutivo confirma o entendimento firmado pelo STF quando do julgamento das ADIs 7.047 e 7.064 – oportunidade em que, além do reconhecimento da inconstitucionalidade do chamado “subteto dos precatórios” instituído pelo governo Bolsonaro em 2022, o tribunal decidiu pela criação de um waiver fiscal temporário para os valores excedentes ao subteto, permitindo que o governo federal, através de créditos extraordinários, pudesse descontar tais valores para fins de apuração da meta fiscal. A PEC confirma o waiver até o exercício fiscal de 2026, estabelecendo uma reinclusão escalonada destes valores para o cômputo da meta, a partir de 2027, na ordem de 10% dos estoques por ano, até o atingimento do valor total.
O Substitutivo também alterou a redação anteriormente dada ao § 19-A do artigo 165 da CF/88, que reclassificava como despesas financeiras, para fins de cumprimento das metas fiscais, o valor dos precatórios correspondentes a juros e correção monetária. A mudança veio na esteira das críticas quanto a um eventual espaço fiscal extra criado pela norma – que poderia alcançar cifras superiores a R$ 10 bilhões.
Este risco, no entanto, não foi completamente sanado pela redação final do Substitutivo. Isso porque a nova redação proposta para o § 18-A do artigo 165, ao incorporar os créditos adicionais abertos em função do diferencial inflacionário no limite de gastos, legitimaria artifício contábil equivalente, gerando espaço adicional para despesas. A tendência é que tal saída seja objeto de novas discussões no Senado.
Por fim, quanto aos novos parâmetros para o pagamento de estoques de precatórios subnacionais em atraso, o texto determina que, caso o valor se limite a 15% da Receita Corrente Líquida (RCL) do ente, o limite máximo de pagamento naquele exercício será de 1% de sua RCL. Tal limite cresce progressivamente com o percentual de comprometimento da receita, sendo fixado em 5% para estoques que superem 85% da RCL.No caso de existência de estoque em atraso após 10 anos, os limites serão expandidos em 0,5 p.p.
Em vista da expansão de estoques observada nos últimos 10 anos, precatórios e RPVs passaram a representar um grande desafio para os planejamentos orçamentários de médio e longo prazos. O waiver concedido pelo STF, ainda que meritório, teve o condão apenas de postergar a urgência da discussão – que adquiriu tons preocupantes com a perspectiva de estrangulamento das despesas discricionárias e com a dificuldade do Novo Arcabouço Fiscal em conter a piora estrutural enfrentada pelas despesas primárias. O Substitutivo atual, mesmo com suas limitações, apresenta avanços institucionais relevantes para a questão, mas é incapaz de, por conta própria, aliviar as incertezas sobre a área fiscal. Congresso e Executivo ainda têm um grande caminho a percorrer.
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