Brasil deve ser estratégico na negociação com os EUA sobre tarifa – Estadão
- Na Mídia
- 11/02/2025
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Em contraponto a outros países, o que o Brasil exporta mais é um produto intermediário, o aço semiacabado, que passa por etapas de transformação em empresas nos EUA até se tornar um produto final
Por Yasmin Riveli*
A imposição de tarifa de 25% sobre o aço e o alumínio importados, pelo governo Trump, é tema sensível ao Brasil, especialmente em relação ao comércio do aço semiacabado. Se a medida for de fato implementada, será importante entender se haverá espaço para flexibilização, com destaque para situação das cotas de exportação isentas da cobrança de tarifa.
Segundo dados da American Iron and Steel Institute (AISI) — o Instituto Americano do Ferro e do Aço —, o Brasil foi a segunda principal origem do aço importado pelos EUA em 2024, atrás apenas do Canadá. No último ano, a importação de aço acabado cresceu 3,7%, enquanto a de aço semiacabado recuou 1,6% ante 2023.
O aço semiacabado é o principal produto siderúrgico exportado pelo Brasil. Em 2024, foram comercializadas no mercado internacional 7,3 milhões de toneladas, e o segmento representou 75,6% das exportações totais de aço do Brasil, segundo o Instituto Aço Brasil e a Secex.
Desde 2010, as vendas de aço semiacabado aos EUA cresceram expressivamente, e a participação passou de 10,2% para 75,5% em 2018 do total exportado do produto pelo Brasil.
Em 2018, o governo dos EUA também lançou mão de medidas protecionistas sobre aço e alumínio no intuito de proteger a segurança nacional.
No entanto, diferentemente de outros países, o Brasil tem a particularidade de exportar majoritariamente um produto intermediário, o aço semiacabado, que passa por etapas adicionais de transformação realizada por empresas localizadas nos EUA até se tornar um produto final.
Assim, diante do reconhecimento da relação complementar com o próprio desenvolvimento da indústria siderúrgica nos EUA, foi negociada uma cota rígida de 3,5 milhões de toneladas anuais isenta da tarifa.
Dados recentes da Secex — referência: CUCI grupo 672 (Produtos semiacabados, lingotes e outras formas primárias de ferro ou aço) — mostram que, em 2024, a exportação total de aço semiacabado recuou 18,9% (após expansão de 11,3% em 2023), mas os EUA mantiveram elevada participação nos embarques, absorvendo 73,7% do total exportado.
A AISI, em relatório publicado em 2025, destaca distorções no mercado de aço supostamente criadas pelo excesso de capacidade siderúrgica na China e apoia a implementação de medidas que contribuam para a elevação da taxa de utilização de capacidade da indústria siderúrgica dos EUA para 80% (a taxa ficou em 74% em fevereiro de 2025).
Indústria brasileira já sofre com o aço chinês
Para o Brasil, a medida de tarifa tem efeitos negativos para a indústria siderúrgica local, que já sofre internamente com a competição com o aço chinês e, nos últimos anos, tem operado abaixo dos 70% de utilização de capacidade instalada.
Adicionalmente, a imposição de tarifas adicionais sobre a produção siderúrgica chinesa pode ampliar ainda mais o escoamento da produção chinesa para o Brasil, tornando o cenário doméstico ainda mais complicado.
Assim, o Brasil tem de negociar estrategicamente, dada a importância do aço semiacabado para a produção norte-americana e também o fato de o Brasil acumular déficit comercial com os EUA (-US$ 283,8 milhões em 2024, de acordo com a Secex), o que, se bem costurado, poderia nos colocar em uma posição de alvo menos prioritário nas empreitadas protecionistas do governo Trump.
*Yasmin Riveli é economista e analista da Tendências Consultoria
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