ARTIGO, por Rafael Cortez: “A economia política do atraso e a eleição presidencial de 2026” – DC News
- Na Mídia
- 03/06/2025
- Tendências

O Banco Mundial divulgou um relatório apenas para tratar do que os economistas chamam de “armadilha da renda média”, fenômeno que, a grosso modo, explica as dificuldades de os países atingirem o status de riqueza e do consequente bem-estar social. De acordo com o estudo, algo como 75% da população mundial vive em países que conseguiram escapar da pobreza generalizada, mas que não conseguem manter trajetória de crescimento econômico. A ideia é que o caminho para riqueza seria feito a partir da capacidade dos sistemas econômicos resolverem os dilemas dos 3i: investimento, infusão e inovação. O Brasil é um exemplo clássico de um país preso na armadilha da renda média; por alguma razão o país não consegue mais introduzir conhecimento externo para fazer o catch-up (alcançar ou recuperar o atraso) na tecnologia da produção e tampouco consegue inovar, gerando a destruição criativa necessária para dar salto de crescimento.
A armadilha da renda média é pensada pela literatura econômica, mas tem um componente fundamentalmente político. A ausência de coalizões para dar suporte à inovação institucional e a quebra das políticas públicas que travam o desenvolvimento. Os grupos de interesse no Brasil, por exemplo, conseguem se apropriar de espaços orçamentários impedindo a realocação dos gastos em políticas públicas com retornos sociais positivos. Convido o leitor a pensar sobre o componente político do desenvolvimento à luz da discussão tributária mais recente, qual seja, as mudanças nas regrado Imposto sob Movimentação Financeira (IOF).
O governo federal alterou alíquotas do tributo à luz da sua reavaliação da política fiscal para 2025. E anunciou bloqueio orçamentário em paralelo ao aumento de tributos como parte da sua estratégia para cumprir o novo marco fiscal. As reações do mercado e dos agentes econômicos, por óbvio, foram negativas, o que gera mais incerteza acerca da política econômica que irá sustentar a busca pela reeleição do presidente Lula. Esse episódio é mais um capítulo da longa novela de paralisia decisória no interior do sistema político, tal como esperado pela literatura política da armadilha da renda média. A política brasileira não consegue produzir acordo sustentável ao longo do tempo acerca de uma política orçamentária que consiga gerar superávit primário.
Essa economia política do atraso é resultado da falta de apoio político para corte das despesas combinado com o veto ao aumento de carga tributária. Esquerda e direita não conseguem encontrar bases de acordo especialmente diante da constitucionalização de diversas despesas. A permanência desse cenário em termos econômicos é sinônimo de taxa de juros elevadas, o que quebra a perna macroeconômica do desenvolvimento. O custo de capital elevado funciona como inibidor dos investimentos e de inovação. Por ora, a elite política não dá sinais de que encontrará saídas para resolver esse impasse que terá peso crescente como entrave ao crescimento econômico mais elevado.
O resultado dessa paralisia decisória é a vida curta de qualquer regra de gasto público no país. O teto de gastos teve fim precoce, movimento esse que parece ser o destino no novo marco fiscal, que supostamente teria mais duração por ser menos ambicioso no controle das despesas. A economia política do atraso é resultado direto da radicalização entre as forças políticas que competem pela disputa presidencial. A era da moderação da política brasileira (1994-2014) que permitia algum consenso entre esquerda e direita no Brasil terminou e ainda não foi reconstruída. A eleição de 2026 dificilmente será espaço para construção desse acordo entre esquerda e direita. Os primeiros sinais sugerem manutenção dessa polarização e imbróglios políticos alimentados pela provável judicialização da campanha.
Rafael Cortez é doutor em Ciência Política (USP), professor do IDP-SP e sócio da Tendências Consultoria.
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