Análise do mercado de saúde suplementar – CBN Fortaleza e jornal O Povo

Quando se trata do mercado de saúde suplementar, as reclamações não são uma novidade. Desde que a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) criou o Índice Geral de Reclamação (IGR), em 2018, elas mais que dobraram no país. Como Jocélio Leal aponta em seu artigo para o jornal O Povo, no lançamento desse índice, as reclamações foram de 15,5 para cada grupo de 100 mil beneficiários. Já no primeiro trimestre de 2023, foram de 43,3.

Lá em 2015, a Tendências já fazia um prognóstico bem doloroso, como aponta Jocélio. “As empresas que oferecem planos aos funcionários sofrem com os aumentos de preço e as operadoras sentem a mialgia de déficits crescentes. A dor das operadoras não comove os clientes. A conta é paga com dificuldade e com alguma revolta, ante o direito à saúde pública de qualidade.”. E, em 2023, o mercado de saúde suplementar ainda é acometido por problemas que afetam tanto as operadoras quanto os usuários dos planos.

Em entrevista para o programa O Povo da rádio CBN de Fortaleza, Eric Brasil, sócio da Tendências, comenta sobre os problemas no setor de saúde suplementar.

Brasil acredita que, se nada for feito em termos de mudança no ambiente de negócios para o setor de saúde suplementar, o futuro será bastante temerário. Isso porque, de acordo com ele, estamos tentando atacar, utilizando a regulação, os efeitos de um problema estrutural (no caso, o custo crescente dos planos de saúde), sem cuidar, do ponto de vista regulatório, das causas desse efeito, como, por exemplo, tentar entender o motivo de os custos serem crescentes e as dificuldades que uma operadora enfrenta no momento de repassar esses preços, além dos aumentos dos insumos, principalmente durante a pandemia.

“Se nada for feito, do ponto de vista estrutural, se nós não mudarmos a cultura de regulação do setor, esse problema tende a se agravar e cada vez mais nós veremos operadoras de planos de saúde com dificuldades financeiras tentando, de alguma forma, sair do mercado, restringindo a oferta de planos de saúde. E, por outro lado, quanto menor a oferta de planos de saúde, maior a pressão na saúde pública”, diz Brasil. 

Brasil menciona as famílias que veem os planos de saúde como a única forma de conseguirem ter acesso à saúde privada, como mecanismos, hospitais e clínicas. Se elas não têm mais acesso a um plano, a saída é buscar a saúde pública, aumentando a demanda e sobrecarregando mais ainda o sistema, que já tem dificuldade em atender a demanda atual.

Concentração do mercado de saúde suplementar

Quando questionado sobre a possibilidade da concorrência e concentração de mercado por parte das grandes empresas de plano de saúde, que já estão consolidadas, Brasil acredita que esse fenômeno seja natural, principalmente por conta da busca delas para se manterem viáveis e saudáveis economicamente.

Brasil cita a ampliação das redes de atendimento e a concentração e verticalização das suas operações como um dos mecanismos que essas empresas podem seguir para tentarem manter a equação econômica dos seus contratos e serviços equilibradas. Entretanto, do ponto de vista da estrutura, para os beneficiários atendidos, esse fenômeno não é bom.

Nas palavras de Brasil, quanto maiores forem esses players, maior seria a concentração de mercado que eles têm e, também, a dificuldade que teríamos, no futuro, de conseguir enxergar se, de fato, os custos estariam sendo repassados de maneira correta e se as margens de retorno desse negócio seriam adequadas e competitivas.

“A concentração é algo que as empresas, inicialmente, buscam para sobreviver, mas, no longo prazo, acabam onerando ainda mais o sistema de saúde suplementar. O ideal seria o movimento de descentralização, de desconcentração do setor, porque a competição, em uma economia saudável, é o melhor mecanismo que nós temos para garantir margens de retorno do negócio saudáveis, para quem oferta o produto e para quem contrata o produto.”, diz Brasil.

Insatisfação com os serviços prestados pelos planos de saúde

Quando questionado sobre a insatisfação cada vez maior dos clientes com serviços prestados, desde o momento do acolhimento do paciente no local que ele será atendido até, de fato, o atendimento prestado, Brasil diz que é definitivamente um ponto crítico e que a regulação precisa estar atenta a isso.

Mas Brasil acredita que estamos em uma situação que é uma “armadilha” muito ruim, pois, por um lado, existe essa insatisfação dos clientes com os serviços prestados. Por outro, as operadoras de planos de saúde não estão conseguindo fazer frente ao aumento de custo e às necessidades de atendimento que a própria regulação do setor impõe a elas ao longo dos últimos anos.

“Como consequência desse cenário, as empresas buscam reduzir custos onde é possível reduzir – até para fazer frente à dificuldade que elas têm de aumentar o preço dos planos por conta da regulação.”, diz Brasil. Para ele, esse corte de custos tem, como consequência natural, uma redução na qualidade do serviço prestado, principalmente na velocidade e qualidade de atendimento. 

Brasil acredita que preços abaixo do que seriam o equilíbrio de mercado geram uma demanda, pelos beneficiários, maior do que a capacidade das ofertas das operadoras. Isso gera um aumento nas filas de atendimento e, consequentemente, a queda na qualidade, mesmo com as pessoas pagando pelo serviço particular de saúde.

Ida da classe média para o sistema público de saúde

Quando questionado se não seria benéfica, do ponto de vista da pressão política, a ida de muitas pessoas, principalmente da classe média, para o sistema de saúde pública por não poderem pagar pelos seus planos de saúde, Brasil acredita que, infelizmente, o impacto só seria positivo a longo prazo e diante de uma catástrofe no sistema público de saúde.

Brasil reforça que, com o aumento no número de pessoas que buscariam o atendimento no sistema público de saúde, apenas no longo prazo, através de episódios catastróficos de sobrecarga no serviço, o poder público poderia se sentir pressionado a investir em melhorias na capacidade de atendimento. Mas, até isso acontecer, na prática, problemas muito maiores acontecer.

Qual seria o cenário ideal para o mercado de saúde suplementar?

Brasil acredita que o caminho natural defendido pela Tendências como uma trilha ideal para ser seguida no setor passa entre as questões de uma regulação que permita, inclusive, níveis de planos de saúde diferentes.

Por exemplo, planos de saúde que sejam mais baratos para atender um determinado perfil de consumidor, mas que tenham restrições nesse atendimento e níveis de serviços mais compatíveis com o preço.

“O problema é quando você quer colocar no rol de atendimento de todos os planos de saúde todas as doenças que você imagina que seriam, no mundo perfeito, cobertas por esses planos.”, diz Brasil.

Dessa forma, não é possível gerar planos de saúde mais acessíveis, fazendo com que os preços dos planos subam e uma camada importante da população, da classe média mais baixa, que não consegue acompanhar esse crescimento, acabe migrando para o sistema público e sobrecarregando a capacidade de entrega no atendimento.

“A gente precisa avançar em transparência, incentivo a competição e, principalmente, alinhamento de incentivos entre os planos e os operadores de conta, hospitais, clínicas e médicos.”, finaliza Brasil.

Você pode conferir a análise completa no vídeo abaixo e, também, o artigo de Jocélio Leal aqui!

https://www.youtube.com/watch?v=o0OCSsRwcds
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