O Simples Nacional da Reforma Tributária: adaptação necessária
- Reforma tributária
- 13/11/2025
- Tendências
Por: Guilherme Venturini Floresti e Mário Nazzari Westrup, consultores da Tendências
No início da Reforma Tributária, após a promulgação da Emenda Constitucional nº 132/2023 e antes da publicação do Projeto de Lei Complementar (PLP) 68/2024, havia uma leitura apressada de que as empresas optantes pelo Simples seriam “poupadas”, uma vez que fosse mantido o seu tratamento diferenciado, incluindo menores alíquotas nominais.
Contudo, com a conversão do PLP 68/2024 na Lei Complementar (LC) 214/2025, ficou explícito que, mesmo a despeito da manutenção do tratamento diferenciado, as empresas do Simples Nacional seriam diretamente afetadas, dado que as aquisições de optantes não geram créditos de CBS/IBS ao comprador (salvo quando a companhia expressamente optar por recolher CBS/IBS). Essa regra altera incentivos ao longo das cadeias: para quem compra, a comparação passa a ser entre “preço sem crédito” (fornecedor no Simples) e “preço com crédito” (fornecedor no regime não cumulativo).
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Reorganização das cadeias produtivas e efeito cascata
Uma “regra de bolso” útil sugere priorizar fornecedores no regime não cumulativo no início da cadeia — evitando, assim, a tributação em cascata — e deixar optantes do Simples para etapas mais próximas ao consumidor.
Em que pese um bom ponto de partida, tal ótica é insuficiente. A Reforma não mexe apenas na carga; reconfigura a dinâmica de preços em mercados nos quais coexistem firmas sujeitas ao regime geral e beneficiadas, borrando os limites entre os dois grupos.
Lições internacionais: o caso indiano e o CenVAT
A experiência indiana com o CenVAT — onde vige um sistema de tratamento diferenciado para empresas até determinada faixa de faturamento, similarmente ao Simples — oferece pistas. Conforme demonstram Brusco e Velayudhan (2025)[1] em estudo acadêmico, o repasse de eventuais aumentos de carga é substancial entre companhias que recolhem o IVA e entre aquelas, pequenas, que não estão sujeitas a tais aumentos – caso os preços de mercado tidos como referência sejam os de grandes empresas, as menores se baseiam nesta dinâmica heuristicamente para definir mais os seus preços do que propriamente os seus custos efetivos.
Já do lado dos insumos, há evidências de que o IVA encarece as compras quando a firma dispensada do recolhimento desse tributo tem como fornecedores outras que o recolhem. Como as companhias dispensadas não recolhem o tributo, não são capazes de se creditarem e acabam arcando com custos mais altos sem crédito correspondente.
Paralelo com o Brasil: impacto na formação de preços e nas decisões estratégicas
O paralelo para o Brasil é direto: a não “creditabilidade” das compras de optantes do Simples tende a influenciar preços relativos, escolha de fornecedores e estratégias de inscrição ou não no regime de CBS e IBS.
Neste contexto, as decisões das empresas que comercializam com companhias do Simples não podem se basear somente em análise contábeis. É preciso considerar uma série de medidas, tais como o mapeamento de fornecedores por regime e posição na cadeia e a simulação de passthroughs de acordo com hipóteses de creditamento ou não. Somente assim é que tais firmas poderão ajustar adequadamente suas políticas comerciais com seus fornecedores e clientes do Simples.
[1] BRUSCO, Giacomo; VELAYUDHAN, Tejaswi. Vat incidence in real vat systems. Journal of Public Economics, v. 249, p. 105447, 2025.
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