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O impacto da Reforma Tributária na avaliação de ativos

Por: Mário Nazzari Westrup, Diego Rodrigues Lucchesi e Maurício Palugan Júnior

A implementação da Reforma Tributária exigirá uma releitura criteriosa dos indicadores financeiros e, por consequência, das avaliações de empresas. A coexistência de regras antigas e novas rompe séries históricas e reduz a comparabilidade de margens, impostos e capital de giro, criando ruído justamente quando analistas precisam projetar lucros e fluxos de caixa com precisão.

Esse ruído se intensifica com oscilações em provisões e contingências, mudanças na taxa efetiva de tributos e reconhecimento de créditos e diferimentos. O cronograma de recolhimento e o novo desenho de apuração alteram o ritmo do caixa, afetando métricas de solvência e cobertura de juros. O resultado é um período em que variações contábeis e de liquidez se confundem, exigindo decompor o que é estrutural do que é transitório.

No Fluxo de Caixa Descontado, a transição impõe projeções em camadas: um cenário pró-forma “pós-reforma”, um cenário de convivência e os efeitos de passagem entre ambos. Pequenas diferenças em alíquotas, base de cálculo e cronologia de créditos deslocam de forma relevante o NOPAT (Lucro Operacional Líquido Após Impostos) e o capital de giro, com impacto direto no valor presente. Vale incorporar distribuições de probabilidade para premissas fiscais, ajustar WACC (Custo Médio Ponderado de Capital) para risco regulatório e trabalhar com faixas de valor, não pontos únicos.

A análise por múltiplos também requer atenção. Indicadores que levem em consideração o EBITDA (Lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) precisam partir de uma normalização que expurgue efeitos de transição, reclassifique impostos recuperáveis e evidencie o run rate após a estabilização. Comparações setoriais devem considerar mix de receitas e regimes aplicáveis, enquanto o valor da firma deve refletir passivos e ativos tributários extraordinários, evitando que créditos e contingências distorçam a métrica de referência.

Do lado da governança, a tarefa é oferecer trilhas de reconciliação entre imposto caixa e competência, pontes de capital de giro e guias claros sobre repasse de preços e elasticidade. Covenants baseados em margens e alavancagem talvez demandem aditivos para isolar efeitos temporários. Sem essa transparência, o mercado tende a punir o risco de modelo mais do que a realidade econômica do negócio.

Em síntese, a Reforma não inviabiliza o valuation; ela exige mais método. Empresas que reancorarem suas bases pró-forma, explicarem a ponte entre o “antes” e o “depois” e tratarem tributação como variável de negócio – e não apenas de compliance – podem preservar credibilidade e o custo de capital. Já as que subestimarem a transição poderão ver preço e percepção de risco se deteriorarem mais pela falta de sinalização do que por fundamentos.

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