‘O governo Lula está no modo eleitoreiro’ – O Estado de S. Paulo
- Na Mídia
- 11/03/2025
- Tendências
Segundo Gustavo Loyola, para manter a popularidade, governo não só torna política monetária menos eficaz e efetiva como também mantém os juros mais altos pela questão da piora do prêmio de risco do País
Para o ex-presidente do Banco Central e sócio da Tendências Consultoria Integrada, Gustavo Loyola, a desaceleração do Produto Interno Bruto (PIB) no quarto trimestre de 2024 já reflete, ainda que de forma incipiente, o impacto do ciclo de alta da taxa Selic iniciado em setembro. Por outro lado, de acordo com ele, as medidas que o governo acaba de anunciar podem levar a um pouco de perda de eficácia da política monetária.
“O governo está no modo eleitoreiro, continua dando tiros no próprio pé”, disse o ex-BC ao se referir a ações como a liberação de recursos do FGTS para trabalhadores que foram demitidos e haviam optado pela modalidade saque-aniversário.
Indiretamente, de acordo com Loyola, essa e outras medidas vão acabar por afetar a credibilidade do esforço do Ministério da Fazenda para equilibrar as contas públicas.
Confira os principais trechos da entrevista concedida ao Estadão/Broadcast:
Um dos destaques do PIB de 2024 foi a desaceleração no quarto trimestre. Já tem efeito da política monetária nessa desaceleração?
Acho que não é o único efeito, mas certamente a política monetária é um deles. Temos três efeitos, mas o primeiro é a política monetária. Acho que é o mais importante.
Quais são os outros dois?
O segundo são as transferências do governo, que aumentaram nos primeiros trimestres e diminuíram no final do ano. Isso levou aos sinais de desaceleração do mercado de trabalho. E a inflação, que, mesmo com a subida do juro, também aumentou, contribuindo para o menor consumo. Aí você começou a ver uma desaceleração bem generalizada. O setor de serviços cresceu só 0,1% no último trimestre e o de construção civil também. Então, vamos dizer, isso teve muito da política monetária.
Como fica, na sua visão, o cabo de guerra com, de um lado, o BC puxando o juro para esfriar a economia e, de outro, o governo adotando medidas de estímulos ao consumo para tentar recuperar a popularidade?
É exatamente isso! O governo está no modo eleitoreiro, reagindo fortemente à queda da popularidade. Tanto que trocou o responsável pela área de comunicação, trouxe lá um marqueteiro conhecido (Sidônio Palmeira). Essas tentativas do governo de recuperar a popularidade à custa de medidas econômicas populistas atrapalham não apenas diretamente a política monetária, mas indiretamente também dão sinais contrários na questão fiscal, que significam aumento de gastos.
Aumento de juros, mais à frente, não impacta a dívida? Isso não pode se traduzir em mais desaprovação?
Exatamente. Não apenas a política monetária fica menos eficaz e efetiva, como também mantemos os juros mais altos pela questão da piora do prêmio de risco do país. Se tivéssemos todo o governo no mesmo tom do BC, nós teríamos uma inflação caindo mais rapidamente e a possibilidade de a política monetária ser afrouxada o mais rapidamente possível. E isso traria benefícios para o governo daqui a um ano, na véspera das eleições.
E qual é a dificuldade para se entender essa lógica?
Esse entendimento para nós economistas é uma coisa meio óbvia. Mas parece que para as pessoas que cercam o presidente e para ele próprio não é assim que funciona. Essas políticas, dependendo da sua intensidade e características, podem fazer com que em 2025 a gente tenha os juros ainda muito altos e a inflação muito alta, que é uma combinação extremamente negativa do ponto de vista de popularidade. O governo está seguidamente dando tiros no próprio pé.
Em quanto que o sr. acha que a taxa de juro pode chegar? E a inflação e o câmbio?
A Tendências prevê 15,5% de juro no final do ano e acho que a nossa inflação já está próxima de 6%. Quanto ao câmbio, acho difícil ficar muito abaixo do patamar de hoje.
O sr. consegue vislumbrar a continuidade da tranquilidade que estão dando ao presidente do BC, Gabriel Galípolo, para trabalhar?
Esse é outro aspecto a ser observado. Será que quando estivermos mais próximos das eleições o Banco Central não vai virar alvo de tiros, do fogo amigo? Os juros vão estar altos e a inflação alta. Será aquele ambiente típico para se culpar o Banco Central e ficar exigindo queda de juros a qualquer custo. Então, apesar de você ter até agora o Galípolo trabalhando em paz, não sei se esse ambiente persiste.
Como o sr. viu as medidas anunciadas na semana passada, como a zeragem do Imposto de Importação para reduzir preços de alimentos, por exemplo?
Não acho que serão efetivas porque não tem tanta disponibilidade de alimentos no mundo. O Brasil produz, é o grande produtor desses alimentos cujas tarifas foram zeradas. E digo mais. Para a maioria deles, se não para todos, os custos de produção no Brasil são menores. Então, a não ser que outros países façam dumping, vendendo abaixo do custo, não vejo nenhuma efetividade nisso. Se tiver algum peso, é irrelevante.
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