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Reforma tributária: desafios para reequilibrar contratos de longo prazo – Jota

Mudança exige adaptação nos contratos de concessão, com incertezas sobre o reequilíbrio econômico-financeiro

Por André Paiva, Fábio Tieppo, Matheus Aquino*

Após a aguardada aprovação da reforma tributária (EC 132/2023), o foco da discussão no âmbito político passou a ser a regulamentação das normas constitucionais. Apesar dos potenciais benefícios da simplificação do sistema tributário e dos ganhos de produtividade, o cenário atual ainda gera incertezas.

Uma vez que a reforma impactará de forma estrutural todos os setores, espera-se uma ampla mudança nos preços relativos, de maneira que grande parte dos contratos de longo prazo será afetada, demandando reequilíbrios.

Nesse contexto, um dos principais pleitos do setor de infraestrutura é a possibilidade de reequilíbrio cautelar. Esse mecanismo consiste em reequilibrar de forma provisória os contratos, evitando que as concessões sofram impactos significativos nos seus fluxos de caixa. Assim, havendo divergência em relação ao impacto total do evento, promove-se provisoriamente o reequilíbrio da parte incontroversa, sendo a diferença discutida posteriormente.

A possibilidade do reequilíbrio provisório foi apresentada no texto “Substitutivo ao Projeto de Lei Complementar nº 68”, segundo o qual esse mecanismo poderá ser adotado a critério da administração pública. Ou seja, não o torna obrigatório nem define critérios objetivos para a sua ativação, limitando-se a indicá-lo como uma possibilidade.

Quando questionado sobre o processo de reequilíbrio dos contratos de longo prazo, o secretário extraordinário de reforma tributária, Bernard Appy, afirmou ser importante considerar que a nova sistemática de tributação começará a ser praticada em 2027, de modo que as agências terão um período de mais de dois anos para planejar a mudança.

Assim, sua sugestão é que, nesse intervalo, os modelos sejam preparados pelas agências reguladoras para essa quantificação e, à medida que os impostos começarem a ser cobrados, a alíquota seja apenas um input. Ou seja, deve-se avançar nos modelos de reequilíbrio antes de a nova sistemática ser efetivamente implementada, tornando o processo célere e provendo uma maior previsibilidade para os agentes interessados.

A reforma afetará de maneira estrutural os modelos de reequilíbrio atualmente utilizados, uma vez que as estruturas de fluxo de caixa dos contratos consideram a mecânica tributária atual. Partir dos modelos atuais e implementar ajustes poderá gerar distorções nos valores de reequilíbrio.

A alteração na alíquota efetiva é apenas um dos fatores que afetam o equilíbrio dos contratos. Em diversos casos, existirão efeitos indiretos com potencial para impactar significativamente o caixa das concessões e, consequentemente, a capacidade de investimento das concessionárias.

Por exemplo, várias concessões exploram receitas acessórias, como exploração de publicidade, aluguel de espaços e reciclagem de lixo. As alterações de alíquota podem afetar os custos e as receitas com a exploração dessas operações, além de terem o potencial de impactar a demanda, uma vez que a busca por esses serviços pode ser elástica – ou seja, na hipótese de os preços aumentarem, a demanda é reduzida.

Ademais, as concessionárias incorrerão em elevados custos de adaptação, com o desenvolvimento de novos sistemas contábeis e gerenciais. A necessidade de tais investimentos decorre diretamente da reforma tributária e não está associada à alteração de alíquota.

Os preços relativos dos insumos utilizados também serão afetados. Regra geral, alterações ordinárias nos preços de insumos são um risco do concessionário. Ocorre que os efeitos da reforma tributária podem configurar uma variação extraordinária, o que justifica o reequilíbrio. Contudo, ainda não está claro se, neste caso, as variações nos preços dos insumos serão incluídas no cálculo do reequilíbrio e em que magnitude.

Nesse sentido, diversos desafios deverão ser endereçados, a começar pela diversidade de parâmetros de equilíbrio definidos nos contratos. As diferentes concessões poderão observar impactos não apenas nas receitas, mas também nos custos de insumos e demais dispêndios com seus fornecedores, sendo o saldo final incerto.

O texto substitutivo estabelece que as pessoas jurídicas integrantes da administração pública com atribuição para decidir sobre procedimentos de reequilíbrio econômico-financeiro poderão regulamentar a forma de apresentação do pedido de reequilíbrio e as metodologias de cálculo recomendadas para demonstração do desequilíbrio. Uma vez que existem diversas agências reguladoras em diferentes âmbitos federativos, há um enorme potencial de serem apresentadas metodologias distintas, o que gerará resultados díspares e aumento da insegurança jurídica.

Portanto, mesmo que exista um modelo padrão, ajustado por um valor de alíquota como input, cada contrato terá suas especificidades técnicas com características próprias. Tal fato provavelmente resultará em pleitos de desequilíbrio adicionais e específicos para cada caso, demandando uma análise quantitativa para cada tipo de concessão.

*André Paiva é consultor da Tendências Consultoria. Economista pela Fecap, com mestrado em Economia Aplicada pela Esalq/USP e MBA em Gestão Financeira e Econômica de Tributos pela FGV.

Fábio Tieppo é consultor da Tendências Consultoria. Graduado em Engenharia de Produção pela Poli/USP e em Direito pelo Mackenzie, com mestrado em Economia pela FEA/USP e pós-graduação em Administração de Empresas pela FGV

Matheus Aquino é economista pela FEA/USP, com mestrado em Economia Aplicada pela FEA-RP/USP.

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